Novo, Não Remendado

“Então lhes contou esta parábola: Ninguém tira um remendo de roupa nova e o costura em roupa velha; se o fizer, estragará a roupa nova, além do que o remendo da nova não se ajustará à velha. E ninguém põe vinho novo em vasilha de couro velha; se o fizer, o vinho novo rebentará a vasilha, se derramará, e a vasilha se estragará.” – Lucas 5: 36-38

Jesus estava sendo questionado quanto ao fato de que diferentemente dos discípulos de João e dos fariseus, os Seus não jejuavam. Os fariseus cumpriam o jejum como um ritual que se tradicionalizou para além das normas da lei de Moisés. E essa tradição era tida como padrão. Jesus estaria “fora dos padrões” com Seus discípulos. Ao dizer esta parábola Ele está respondendo aos por quês dos fariseus, sinalando que sua doutrina era nova e portanto não podia ser costurada, remendada junto ao padrão velho das normas deles. Ao mesmo tempo, ao fazer o uso repetido do adjetivo “novo” para Se referir à Sua realidade espiritual, Ele está calcando aquilo que é a marca da vida com Deus, daquele que caminha com Cristo.

Paulo já disse que em Cristo somos nova criação. O novo é terminologia própria ao Deus da nova aliança. Jesus o estabeleceu como ponto de partida para quem O seguir: “Necessário é que nasçam de novo. Se alguém não nascer de novo não pode ver o Reino de Deus”.

E assim, ao longo do Novo Testamento vamos sendo acostumados com essa terminologia que é indicativa e normativa quanto à vida dos que seguem a Cristo: nova criatura, novo homem, nascer de novo, novidade de vida, novos céus e nova terra…

Não há lugar para remendo, para ajustar o novo ao velho, ao que havia antes, ao que se tinha primeiro. Não há lugar. O vinho novo ao fermentar vai estourar o odre velho de couro sem flexibilidade.

Isto vale para o jugo que Cristo nos ofereceu. Ao nos falar de Seu jugo, num contexto onde nos viu com sobrecarga, Ele está comunicando que há um jugo novo a ser assumido: o Dele. Não é mais um jugo. Não é jugo a ser somado ao que trazemos como herança de nossos sonhos, dos sonhos e propósitos de nossos pais. Não é novo programa a ser adaptado, como remendo novo em pano velho, dos nossos programas de vida e seus planejamentos.

É novo, para substituir o que trazemos como jugo de nossa existência, história pessoal, que nos custa o preço da sobrecarga, da perda da simplicidade da vida, em cuja direção o Senhor aponta.

É outro jugo, que só pode ser assumido uma vez que abandonemos o nosso. É jugo substituto. É Dele, que se torna nosso. Novo, não um ajuste, nem um acréscimo, mas uma substituição. Foi disso que Ele falou e é disso que Ele trata. É o que nos oferece. Não podemos colocar o vinho novo da nova vida em Cristo, nova aliança, nos odres velhos de nossa existência comum aos demais, dos padrões e hábitos de uma vida que se revela tão velha quanto o velho homem, filho de Adão. O jugo de Cristo não pode ser costurado ao que trazemos. Foi isso que Ele comunicou.

Seu jugo é suave. Mas se pretendermos somá-lo ao que trazemos, será pesado demais para darmos conta dele.

O Filho de Deus não faz nem aceita remendos. Ele faz novo, sempre.

Sacerdotes da Casa

Então todo o povo partiu, cada um para a sua casa, e Davi voltou para casa para abençoar sua família.” – I Crônicas 16:43.

Foi o tempo de uma grande festa em Israel. Festa de Deus e para Deus. O rei Davi estava feliz pela restituição da Arca da Aliança a Jerusalém e celebrou isso com um grande culto. Nessa ocasião também ordenou o serviço dos cantores de Israel e as funções dos sacerdotes. Foi quando expôs em público pela primeira vez suas composições de salmos e os entregou aos cantores para conduzirem o louvor. São as mensagens que compõem, respectivamente, os salmos 105 e 96.

A alma de Davi estava em festa, mas o evento chegou ao fim. Era hora de voltarem todos para suas casas. O relato histórico frisa uma acentuada diferença de movimentos entre o povo e Davi.

Havia ali milhares de chefes de família constituindo o povo e em destaque o seu rei. O texto afirma que todo o povo foi embora para casa e também Davi. A nota de realce fica por conta de Davi que volta para casa com um propósito: abençoar sua família.

O mesmo texto nos diz que antes disso o rei já havia repartido pão, bolos e frutas entre o povo. Logo, não é disso que fala ao registrar que ele leva bênçãos para sua casa. Como foi dito, a alma de Davi estava em festa. A festa acabou no visível e real, mas não o seu efeito no coração do rei.

Creio que é esse efeito que ele leva para dentro de casa. É o que pretende repartir com sua família.

Aqui desponta uma nobre lição para nós hoje, homens e mulheres chefes de seus próprios lares: somos sacerdotes e sacerdotisas neles. É o primeiro lugar onde podemos desempenhar nossas funções de sacerdócio real: intercessores, ministradores, abençoadores. É o ninho onde nos recolhemos ao final de cada dia. É nosso único espaço-encontro-eu. Onde somos quem somos e podemos ser como somos. Nosso refúgio, nosso jeito, nosso cheiro, nossa cor e cara. Nosso santuário, enfim. Sejamos sacerdotes nele. Assumamos o compromisso possível e para o qual estamos devidamente potencializados por Deus para abençoar nossa família, levando a ela nossa alma, o que ela vivencia e percebe da Presença de Deus.

Se somos abençoadores de nossa própria casa, por certo isso se estenderá porta a fora, quando a casa sair pela porta das ruas. Mesmo aqueles e aquelas que por circunstâncias ou opção vivem sós em suas casas, podem nelas ministrar de forma que essas casas se tornem ambientes de refúgio e refrigério a quantos por ela transitarem. E quando não houver outro a abençoar ali, abençoemos nossas próprias vidas, pois disso se servirão outras vidas mais, depois.

Marcos Irremovíveis

Não removam os marcos antigos…” – Provérbios 23:10.

Palavra de sabedoria, dessas que se não observadas, redundam em consequências sensaborosas ou até mesmo com danos severos.

Faz parte da experiência humana desfazer o velho para dar lugar ao novo. Invariavelmente isto é apontado como avanço inevitável do progresso. No que respeita a espaços físicos, é óbvio tratarse de uma inevitabilidade recomendável em quase todas as situações em que se faça necessário construir algo maior e melhor, como registra a memória das civilizações de todas as épocas.

Mas, a recomendação sábia da Palavra de Deus aponta mais depressa para aquilo que entendemos como sendo os marcos da tradição que pontua a construção da sabedoria pelo acúmulo das experiências da vida de nossos antepassados. Em especial as que orbitam em torno dos valores morais.

Há marcos que precisam ser vistos como irremovíveis, dadas as funestas consequências que sua retirada carreia. Apenas para pontuar alguns deles: a autoridade dos pais no lar; os limites de velocidade no trânsito; a fidelidade conjugal; o direito do trabalhador; a inocência e o lúdico da infância; a integridade da sexualidade adulta.

Quando vemos a sociedade estabelecendo leis para fazer valer marcos antigos, sabemos que algo de muito ruim, típico de deterioração de valores, está em andamento. Mas tanto pior quando somos protagonistas da fabricação de leis novas que tentam burlar ou impor uma nova moralidade à sociedade para que uma parcela dela se beneficie contrariando padrões adquiridos e cultivados por centenas de gerações precedentes. Em especial no que tange à sexualidade, à liberação de maioridade para menores de 18 anos, e toda e qualquer lei que corteje a impunidade daquilo que outrora era reputado por imoral e inviável.

Outro tanto, atende ao “remover marcos antigos” a promoção de leis que transgridem direitos adquiridos.

Na área da sexualidade, a permissividade de acesso a imagens e produtos eróticos ou pornográficos, via internet ou outras mídias, remove os marcos que respeitam a maturação da personalidade, ainda longe na infância e adolescência, para aquisição de discernimento e capacidade de escolha. E por esta via contam os produtos que investem em estímulos à violência, ao preconceito e desrespeito interpessoal.

Quando se permite a remoção de tais marcos, não se deve lamentar nem questionar o crescimento alarmante de violência doméstica e social, como os genocídios que vemos em escolas e outros ambientes públicos, e outro tanto a gravidez adolescente, cada vez mais comum. Ou não se deve ficar surpreso, como quem pergunta: de onde isso veio ou por que aconteceu?

Tais fatalidades têm atingido nossos dias num crescendo assustador, incluindo suicídios na infância e adolescência, e homicídios perpetrados com uma frieza estarrecedora. Mas, devemos questionar o que foi feito dos marcos antigos que cerceavam a oferta de estímulos capazes de esvaziar numa personalidade imberbe e em formação, os valores da vida, sua sacracidade e pureza. Uma antiga máxima preconizava: “se lixo entra, lixo sai”, para dizer da formação de conteúdos a partir da informação recebida.

Se novas leis regidas pela sociedade vierem a ser fracas em sua proposta ou chegarem até mesmo a ser indutoras de comportamentos bizarros, ditadas pela cobiça ou perversão moral, e se prestarem a remover os marcos antigos, que nem tão antigos são, mas que permitiram às gerações que nos precederam uma vida mais ordeira e mais digna, caberá aos pais, nos lares, restabelecerem esses marcos, enquanto na construção da personalidade de seus filhos. Os marcos existem como limites e referenciais, que se desprezados trazem os motivos de perplexidade e barbarismo que nos rodeiam hoje. Pais mais próximos da vida particular e privativa de seus filhos, mais vigilantes e orientadores quanto às suas escolhas e quanto ao uso das ofertas que por liberais em excesso, não contemplam os limites da mente humana em discriminar e processar tanta informação e com tanto comprometimento contra valores da honra e da dignidade, trarão de volta, esses pais, os marcos antigos que estabeleciam que a educação dos filhos é feita dentro do lar e por seus cuidadores maiores e responsáveis.

A licenciosidade consentida e até estimulada por pais que em nome de uma filosofia liberacionista não protegem a infância que lhes foi confiada pela vida, faz deles nada menos que irresponsáveis e falhos guardiões da mente virgem de seus filhos, além de passíveis de incriminações. Para tanto temos o ECA e os centros municipais de Conselho Tutelar.

Não removamos os marcos antigos. Antes, corramos para restabelecê-los de volta, de onde foram removidos.

Elogio

Nenhuma expressão de comunicação interpessoal produz benefício tão prazeiroso e gratificante quanto o elogio. Comprovadamente o elogio abre portas na comunicação, atrai e até cativa a atenção. Psicologicamente tem efeitos curativos e estimulantes.

O elogio bem orquestrado, ou seja, aquele que traz um lastro de verdade em si mesmo; que não é falácia ou bajulação; que eleva e reconhece valores reais e procedentes em situações dignas; compromete o seu objeto com a manutenção de seu discurso. Daí saber-se que uma criança nutrida com elogios procedentes, o aplauso verbalizado em cada realização bem sucedida ou que encetou a proposta feita, por menor que tenha sido, tende a desenvolver uma personalidade pró-ativa e comprometida com valores nobres em muitas áreas. Ademais, ninguém em sã consciência dispensa um elogio verdadeiro e sincero.

Quem elogia? Quem aplaude! Quem  quer estimular a continuidade de uma realização digna; quem admira, quem ama. E por aí afora.

Há desvios, no entanto: Alguns egos doentios que compram o elogio alheio, ou o induzem à força para receber aplausos imerecidos, que se revelam não mais que bajulação. A bajulação é o falso elogio. Também os que usam de elogio que se traduz em sedução, e esta tem compromisso sempre com o egoísmo, a busca por vantagens.

Mas volto à questão: Por que o elogio beneficia tanto? Ele eleva, ele consola, ele anima, ele estimula, ele gratifica, ele recompensa. É um agradecimento dado com louvor, como se levasse em palavras um troféu conferido a um vencedor de uma grande competição.

O elogio tem um caráter próprio que o explica. Em nosso vernáculo ele é apenas isso: elogio, donde deriva o verbo elogiar. Etimologicamente ele se expõe como uma diacronia do verbo abençoar, que traduz o grego “eulogia”. No grego do Novo Testamento, abençoar é elogiar; bênção é elogio.

Então me detenho pensando no texto de Efésios 1:3 – “Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo que nos abençoou com todas as bênçãos espirituais nas regiões celestiais em Cristo.”

Estou com este texto aberto no original, diante de meus olhos. Inevitável perseguir a beleza que surge na possibilidade de uma transcrição dele alterando somente as palavras correspondentes, por seus sinônimos, e obedecendo a localização textual primitiva: “Elogiado seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos elogiou com todos os elogios espirituais nas regiões celestiais em Cristo.”

Fica fácil agora entender esta recomendação bíblica em Romanos 12:14 – “Abençoem aqueles que os perseguem; abençoem, e não os amaldiçoem”.

Simples assim: “Elogiem-nos”. E o seu oposto, amaldiçoar, ficaria: “Não falem deles aquilo que os condene”.

Também fica fácil, posto tudo isso, entender por que o Senhor Jesus quando Se comunica com cada uma das sete igrejas da Ásia Menor, em Apocalipse de 2 a 3, antes de repreendê-las merecidamente, acha nelas o que elogiar, e o faz.

Bendito seja Ele. Nós O elogiamos pelo que Ele é, fez e ainda faz.