Maças de Ouro de Jeremias (2)

Põe-te marcos, finca postes que te guiem, presta atenção na vereda, no caminho por onde passaste; regressa, ó virgem de Israel, regressa às tuas cidades.” – Jeremias 31:21 (ARA).

Este apelo divino também se mescla a um alerta, e nos alcança na condição de povo de Deus. O versículo seguinte levanta uma questão onde Deus denuncia uma caminhada errante do Seu povo, aqui identificado como “virgem de Israel”. E a orientação ou alerta do v.31, pressupõe que a caminhada errante ocorre por perda de referenciais, de princípios.

Esta é, lamentavelmente, uma verdade preconizada pela história da igreja evangélica brasileira nas últimas décadas: a ausência de princípios. Faltam- nos princípios e isto é denunciado pela contínua oscilação de “verdades” subgrupais, veiculadas na mídia, onde uma gama muito variada de exponentes de teorias e “doutrinas” estapafúrdias faz de nossa confissão uma colcha de retalhos multifacetada de formas que não têm sustentabilidade escriturística, sendo antes o efeito desprovido de sabedoria, de ufanismos e arroubos “mágicos” ditados em verbalizações que nada dizem, como se fossem gritos de guerras proferidos por bandos de adolescentes em disputas de gincana.

A falta de princípios se vê ainda na variegada forma de cultuar, onde o culto assume o aspecto de espetáculo público feito para entretenimento da fé. Os nossos ambientes de culto estão marcados por uma práxis que oferece serviço espiritual, quase numa concorrência deslavada com os ambientes ocultistas que alardeam o bom êxito do serviço prestado por suas entidades mediúnicas.

No terreno individual, o perfil do crente hoje se mostra disforme, bizarro. A característica que prevalece é aquela cuja fala aponta uma confissão de verbete, quase como um mantra. A letra dos cânticos, nem sempre em acordo com a Revelação Escrita, é a Bíblia que grande número lê e confessa.

Os princípios da fé evangélica, “sola scriptura” e demais, não são do conhecimento de quase totalidade do fenômeno “evangelical” que marcou a evangelização das Américas nos últimos 160 anos. A marca do cristão evangélico como leitor e estudioso das Escrituras, foi substituída por aquela que o evidencia pela forma litúrgica de culto que adota. Poucas portas de templo ainda preservam a boa herança do Estudo Dominical das Escrituras.

O que outras épocas entenderam e aprenderam como moral evangélica, hoje deu lugar ao conceito do moralismo populista que coloca o evangélico
no centro da mídia. Visibilidade ao preço da integridade. O medo de discursar na contramão da opinião popular.

Onde os marcos? O consumismo mundano, cuja regra reza a letra do famoso samba que diz: “Deixa a vida me levar, vida leva eu” (sic), converteu- se nos grandes centros de confissão evangélica populista em segredos espirituais para uma vida bem sucedida financeiramente, com nome de “teologia da prosperidade”. Ser abençoado é ser fornido de posses, é ter muito e melhor. A busca por “ser” assumiu o espectro de “aparecer”. E hoje, para aparecer é importante “ter”.

O princípio da paixão pelo Eterno e consciência de eternidade, reduziu-se a uma busca sôfrega por uma boa fama debaixo do sol. Quanto mais sob holofotes, mais ‘abençoado’ e ‘descolado’.

Nossos marcos não são mais homens e mulheres admirados por sua retidão e altruísmo, mas os “popstars” do showbusiness gospel, que ganham fama…e dinheiro.

Esta geração de crentes, na qual estamos inseridos, precisa regressar às suas origens. Precisa procurar marcos e sinalizações na vereda por onde passa, para que não ande mais vagueando. Vagueando, pode até andar, mas não chegará a lugar algum.

Vale orar, como o salmista: “Restaura-nos, ó Senhor, Deus dos Exércitos, faze resplandecer o teu rosto, e seremos salvos.” – Salmos 80:19

Maças de Ouro de Jeremias (1)

Como maçãs de ouro em salvas de prata, assim é a palavra dita a seu tempo.”- Provérbios 25:11.
Em Jeremias alinhavei doze “maçãs” dessas, selecionando dentro dos seus oráculos os textos que foram tornados clássicos pelo constante e repetitivo uso do povo de Deus ao longo dos séculos.  Hoje pensaremos numa dessas doze “maçãs “.

“Sou eu apenas um Deus de perto”, pergunta o Senhor, “e não também um Deus de longe?” Jeremias 23:23.

No contexto, Deus está irado com os líderes políticos e religiosos de Israel e os acusa de serem a causa do juízo que proferiu contra o povo, decidindo espalhá-los para fora de suas fronteiras. Ao mesmo tempo, ameaça os falsos profetas com essa palavra dizendo-lhes que Ele tudo vê e ninguém se esconde de Seu rosto.

Mas, a um povo que se vê ameaçado de banimento, esta parte do oráculo serve como um consolo em meio a um futuro que se aproxima funesto.

Para nós, que fora do contexto em questão, podemos nos servir desta Palavra específica, que significados aplicativos ela traduz para nossa fé?

Primeiramente importa pensar na declaração por si mesma: Nosso Deus, não está limitado no tempo e no espaço. Como Eterno, o passado e o futuro são presente para Ele. Como o Deus que preenche todas as coisas, tal como Ele mesmo afirmou no v.24 deste capítulo, não há limitação para Seu agir e Seu mover.

Em segundo lugar, já olhando para os desdobramentos possíveis dessa palavra, temos a afirmação reforçada de que Ele é Deus de perto. Nós temos reforço desse conceito em outros textos, sempre com o propósito de traduzir esperança, conforto, companheirismo, o que é inusitado, porque vai muito além do sentido da aproximação do adorador a Ele, para significar Sua aproximação do adorador. Começa com o anúncio evangélico de Isaías 7:14 – “Por isso o Senhor mesmo dará a vocês um sinal: a virgem ficará

grávida, dará à luz um filho e o chamará Emanuel.” E então fomos informados por Mateus que este nome traduz DEUS CONOSCO! Possivelmente a primeira e mais significativa expressão da presença intimista do Deus Eterno e Santo na existência cotidiana de Seus filhos. Jesus, o Emanuel referido anuncia: “Estarei com vocês todos os dias, até à consumação dos séculos”.

E ainda temos Paulo asseverando em Filipenses 4:5 – “Perto está o Senhor”, para dizer logo em seguida, como numa idéia conclusiva: “Não fiquem ansiosos”.

Quanto disso nós nos apercebemos?

Em terceiro lugar, e tão importante quanto, o oráculo de Jeremias registra que o Deus “de perto” também é Deus “de longe”.

Creio que podemos seguramente associar a este texto a mensagem do salmista que parece posicionar seu significado de forma expressiva para nós: “Se eu subir com as asas da alvorada e morar na extremidade do mar, mesmo ali a tua mão direita me guiará e me susterá.” – (Salmos 139:9-10). E aí está conforto e segurança! Quão longe poderemos ir da presença do Senhor, que Ele não nos alcance? E Paulo nos ensina em Romanos que nenhuma distância é suficiente para nos afastar do Seu amor que jamais acaba: “Pois estou convencido de que nem morte nem vida, nem anjos nem demônios, nem o presente nem o futuro, nem quaisquer poderes, nem altura nem profundidade, nem qualquer outra coisa na criação será capaz de nos separar do amor de Deus que está em Cristo Jesus, nosso Senhor.” –  (Romanos 8:38-39). Aleluia! Nada, absolutamente. Nem pessoas ou situações, por mais que nos sintamos esquecidos ou banidos, poderão nos separar do Seu amor pelo qual Ele nos tornou Seus filhos em aliança por meio de Cristo Jesus. A Ele, O Deus de perto e de longe, toda a glória!

 

Fé para Crescer e Superar

“Não terá medo da calamidade repentina nem da ruína que atinge os ímpios”. – Provérbios 3:25

Será que o texto pretende o que sempre desejamos? Que jamais vejamos a calamidade? A calamidade repentina só atinge os ímpios ou a ruína que se segue a ela é que os atinge e a nós? De que nos fala o texto?
Poderemos levar nossa fé com seriedade ou superficialidade de pretensão mágica. Vamos ver o que a Bíblia nos ensina. Não haveria calamidade ou não haveria medo dela? O que nos é proposto aqui?
Quero chamar sua atenção para dois paralelos textuais: Salmo 91:15 e Salmo 50: 15. – “Ele me invocará, e eu lhe responderei; na sua angústia eu estarei com ele, livrá-lo-ei e o glorificarei” (ARA) – “invoca-me no dia da angústia; eu te livrarei, e tu me glorificarás” (ARA).

Fé e Resistência

O que os dois têm em comum? Promessa de livramento.
Destaco o fato de que o verso 15 do salmo 91 faz um fechamento a um contexto de promessas que parecem pretender um escapismo. E isso é tudo quanto queremos: escape. É tudo a que queremos conduzir nossa fé e a que nos seduzem os pregoeiros de uma fé sem lastro.

Mas Deus a ninguém engana. Sabemos que Ele tem poder para nos fazer escapar. E sabemos que algumas promessas apontam nessa direção. Tanto que desconhecemos de quantas coisas somos livrados no mundo espiritual, conforme afirmam Lamentações 3:22 – “As misericórdias do Senhor são a causa de não sermos consumidos, porque as suas misericórdias não têm fim“, e Isaías 64:4 – “Porque desde a antiguidade não se ouviu, nem com ouvidos se percebeu, nem com os olhos se viu Deus além de ti, que trabalha para aquele que nele espera.”

Mas os textos que lemos, de Provérbios e dos Salmos, nos apontam a direção natural da vida neste mundo tenebroso, por onde o Autor da fé nos conduz. Jesus afirmou que teríamos aflições neste mundo. Outro tanto o apóstolo Paulo diz que uma vez ocupando espaço dentro de um mundo natural que está decaído, “…também nós, que temos as primícias do Espírito, igualmente gememos em nosso íntimo, aguardando a adoção de filhos, a redenção do nosso corpo.” – Romanos 8:23 ARA.

Fé e Enfrentamento

Não podemos nos servir de uma fé que nos propõe uma experiência de avestruz, fazendo negação da realidade, com a pretensão de sermos tratados por Deus como queremos tratar nossos próprios filhos: negando- lhes crescimento e superação, protecionistas em excesso. Mas a fé nos foi dada para nos fazer crescer e superar. Vencer e transformar. Não para escapar. Não somos chamados a viver refugiados como covardes, mas lutadores que vencem, superam.

Por isso é importante destacar aqui Isaías 43:2. Ele concorda com a experiência de Paulo relatada em II Coríntios 12:9.

Queremos uma vida de fé que nos garante não passar pelas águas, nem pelos rios nem pelo fogo. Mas a proposta divina é: “ Uma vez lá, eu estarei com você. Quando tiver que lhe dar escape, será através de…”. Por isso em Isaías Ele precede a promessa, ordenando: “Não temas…” Sem o enfrentamento não ocorre o crescimento de vivê-Lo como o Emanuel.

Fé e Conquista

A experiência dos homens e mulheres de fé corre nessa direção nos registros bíblicos: Hebreus 11:35; Romanos 8: 35- 39, que corrobora 8:28.

Deus, nosso amoroso e poderoso Pai nos afirma: “Não fiquem ansiosos…a paz de Deus guardará mente e coração” – Filipenses 4:6.

E tudo isso para mostrar a que nos chamou na fé em Cristo: II Timóteo 1:7.

Jesus, que é a origem de nossa fé, também é seu consumador. Ele é o Primeiro e o Último.

Daí, a conclusão só poder ser: A calamidade pode vir, sim. Ela nos acomete também, mas nunca a ruína que geralmente a ela sucede. É o que aprendemos em II Coríntios 4: 8 e 9. Calamidade sem destruição.

Porque Deus nos chamou para sermos “mais que vencedores”. Conquistadores, e não covardes que se escondem dos desafios da aventura de viver. Não somos privilegiados neste mundo. Somos assistidos e guardados nEle, como quem descansa à sombra do Onipotente. A promessa diz: “Em Deus faremos proezas”; “Enfrentaremos exércitos”. É isso. Enfrentar e vencer. Viver e transformar. Para isso Ele nos desafia a crer.