Outrossim, o reino dos céus é semelhante ao homem, negociante, que busca boas pérolas; e, encontrando uma pérola de grande valor, foi, vendeu tudo quanto tinha, e comprou-a. -Mateus 13: 44-46.
Ao qual, não o havendo visto, amais; no qual, não o vendo agora, mas crendo, vos alegrais com gozo inefável e glorioso. – I Pedro 1:8
Pedro está falando para cristãos, crentes em Jesus, tão homens e mulheres como nós, que criam nas mesmas coisas em que cremos e viviam a experiência de sua fé cristã em modelos semelhantes aos nossos: reuniam-se como povo para ter comunhão, celebrar a ceia, cantar e ouvir o ensinamento das Escrituras. Era gente que orava e evangelizava. Eram diferentes de nós em sua experiência no fato de que não tinham as Escrituras formadas e completas em mãos nem acesso fácil ao que estava escrito; outro tanto não gozavam de liberdade e facilidades para viver sua fé como vivemos hoje. Ser cristão àquele tempo não produzia nenhum status. Pelo contrário, era até mesmo humilhante.
Nos versos anteriores Pedro informa que a fé que eles tinham passava por provas constantes (v.5 a 7). Observe. Criam na vida eterna, nós também. Amavam ao Cristo a Quem não viam. Nós também. Eram provados, nós também. Mas ouvimos que sentiam grande alegria em decorrência da fé que tinham. Nós também? E é por onde começamos a nos distanciar deles.
Destaco dois pontos fundamentais, ressaltando que Pedro os assinala como coisa corriqueira, real, presente, ocorrendo neles em decorrência de serem crentes em Cristo: grande alegria e gozo inefável e glorioso. Onde isso está em nossa experiência de fé?
Preciso, forçosamente, pontuar que lemos estes textos e passamos por cima entendendo que isso nos diz respeito, como se fizesse parte da herança de nossa fé, não necessariamente experiencial. Ou pouco k
No mais o que vemos são crentes divertidos em atos cúlticos, shows gospels onde dançam, gritam, pulam, na mesma medida em que o fazem em suas festas profanas, com o diferencial do ambiente e conteúdo das letras cantadas.
Ou quando vivem surtos fenomenológicos, como cair ao chão, entrar em êxtase de riso ou semelhantes, que duram o tempo de uma reunião e nada acrescentam à sua realidade moral no cotidiano. Ou ainda, e aqui reside a redução maior: confundem gozo espiritual com satisfação pela resposta pretendida numa súplica.
Mas é disso que Pedro fala? Claro que não. Mesmo porque ele fala de uma grande alegria e um gozo inefável que é vivido num contexto no qual o mínimo a esperar é queixa e desespero.
Nem tão pouco ele insinua que a situação de provação é a causa do gozo incomum. Fica claro no texto que a causa é Jesus, Ele Mesmo, Sua Pessoa.
Mas onde reside em nós esta realidade da fé? Até onde a pretendemos? Se a presença de tamanho gozo era marca registrada da vida espiritual deles, o que acontece conosco e o que nos define, evidencia ou qualifica como cristãos? Estamos no caminho certo? Ou: estamos caminhando certo no Caminho?
Como é sua fé? Momentos agradáveis ou efusão do Espírito de Deus?
O que se passa conosco?
Pedro nos mostra de pronto: o ponto de convergência está fora de ponto. Daí a importância de nos voltarmos para a parábola da pérola de grande valor.
Qual sua lição?
O negociante já buscava diversas pérolas. Gosto de associar esta parábola àquela imediatamente anterior onde o personagem é tido apenas como sendo “um homem” e a pérola é um ” tesouro de grande valor”. Nas duas, tesouro e pérola assumem o lugar do objeto desejado. Note que o negociante buscava várias pérolas, pérolas boas, mas encontrou uma incomparavelmente melhor. O homem da outra parábola possuia diversas coisas de que abriu mão, outros tesouros ou outros valores, que se apagaram diante do achado maior. E surgiu um desejo irreprimível que pode ser descrito assim: ” O que encontrei precisa ser meu. Eu o quero. É melhor do que tudo que tenho. Esvazia os valores de tudo que eu tenho. Secundariza, desvaloriza, de maneira que tudo mais perde lugar e valor”. E então se movimenta: um e outro, desfaz-se de tudo para poder comprar a pérola, o tesouro de grande valor.
É isso que falta à maioria dos cristãos. Ainda não se deram conta de Quem de fato Ele é. Não são crentes nEle, mas no que pode vir dEle. Estão presos às suas próprias pérolas e O buscam na medida em que pretendem garantir que Ele os ajude a não perderem nem diminuirem suas pérolas. Buscam-No na medida em que pensam que Ele lhes faz aumentar as pérolas. E O perdem. Vivem longe do gozo inefável.
Em lugar desse gozo, estão ansiosos, temerosos, hipervigilantes sobre a vida e seus aspectos, perigos, ameaças, realizações temporais.
Pérolas redundam em dinheiro, lazer, saúde, família, nome, sonhos e desejos.
Buscar a Cristo está para eles fora de qualquer proposta de abrir mão, perder, sofrer perda. Antes é manter, ampliar e garantir.
Podem trocar facilmente Jesus por Buda ou algum orixá. O que lhes falta é saber que nem um nem outro está escrito na Bíblia como divino.
Porque querem ganhar, perdem. Tal como disse Jesus.
Pensam que gozo inefável, viver no nível da comunhão de filho que tem em Deus seu “Aba”, é coisa para os cristãos do primeiro século ou para alguns excepcionais da fé na contemporaneidade.
Mas nada entendem de grande alegria ou gozo inefável. Seu trânsito como testemunhas de Cristo é apenas e nada mais que viver uma confissão evangélica. Mas onde a paixão? Onde o amor que desprende, que arrebata? Onde a vida cheia do Espírito e de Sua alegria? Entendem por estar cheio o exercício de alguns dons carismáticos, nada mais. E a maioria nem por aí vai.
O que falta? Falta Cristo, como a pérola mais preciosa, cujo valor requer o desprovimento e abandono dos demais valores. Falta de fato saber Quem é Jesus. Árdua tarefa de Paulo, “para conhecê-Lo”. E olhe que poderíamos dizer que Ele já O conhecia suficientemente a partir do primeiro encontro quando à sua pergunta: “Quem és Tu, Senhor”, recebeu a resposta: “Eu Sou Jesus a Quem Tu persegues”. Era de se esperar que ele tivesse ficado satisfeito. Mas dezenas de anos depois; dezenas de experiências e revelações depois, lá está ele, insatisfeito, dizendo abrir mão de todos os seus valores e conquistas pessoais, como a dizer: “Quero conhecê-Lo” (Filipenses 3:10).
Exagero? Bem, o que dizer do que falou o próprio Senhor: “Qualquer que amar pai, mãe, irmãos, filhos, mais do que a Mim, não é digno de Mim” –
Você já se deu conta que esse é o parâmetro para seu cristianismo, o modelo de ser testemunha?
Jesus está textualmente afirmando que não sendo assim, não serve para Ele.
Você está pronto a abrir mão dessas pérolas? Onde está o gozo inefável? Está bom como está? Bem, se você disser que sim, para si mesmo, ouça: o Senhor lhe diz que não.
Enquanto “aba”, não for o nível de sua vida com Ele, e só o Espírito dEle torna isso possível, você está longe do “gozo inefável”.