Carismas E Caráteres -2 | Atos De Discípulos (20)

Atos 13:2 – “…Separem-me Barnabé e Saulo para a obra a que os tenho chamado”.

E aqui mais uma vez nos admiramos na constatação dessa leveza com que o Espírito de Deus manifesta-Se dentro da igreja de Antioquia.

Fomos informados que estes homens, Barnabé e Saulo, contavam junto a mais outros como profetas e mestres. Isso parece esclarecer a pronta resposta com que atendem à voz do Espírito que os cita e alude a um chamado que já parecia previamente sabido por todos. Pode ser que soubessem que dois dentre eles seriam escolhidos para uma grande viagem missionária, a primeira de Saulo, e agora ficaram sabendo quais dentre eles seriam. Ou ainda que já soubessem anteriormente tratar-se daqueles dois, não hesitam em prepará-los para partir. Eles haviam ficado um ano inteiro ministrando entre aqueles irmãos a quem tutelaram, e que agora continuariam por si mesmos na orientação da igreja.

Mas penso nessa forma de comunicação divina: O Espírito de Deus poderia ter falado com exclusividade aos dois envolvidos, cabendo a estes darem ciência aos demais quanto ao chamado feito. Mas não. O grupo todo recebe a comunicação diretamente do Espírito de Deus, e a forma como Ele a faz, é surpreendente. É uma ordem, com tom de acordo, orientação. Traduzindo melhor, soa como se o Espírito dissesse: “Eu chamo, vocês concordam e enviam”. Parece falar de mutualidade, parceria.

Não há por que pensarmos em padrão de vocação aqui, como um dogma de chamado missionário. Contudo é inevitável ver que o Espírito Santo estabelece um princípio que torna evidente essa cumplicidade entre o corpo de Cristo e seus membros, a comunidade de discípulos. Seria demais pensar que devemos ver aqui um princípio espiritual operante, lastro do bom êxito de realizações missionárias? Pois o vejo. Vejo como o princípio em que o Espírito de Deus decide, informa Seu propósito e escolha, e deixa a critério da Igreja obedecer com seu envolvimento, participação e preparo (aqui visto na imposição das mãos), tanto quanto a disponibilidade dos escolhidos para atender. Tudo pode ser resumido nesta formulação tão bem colocada por Ele: “Separem-me a esses dois para a obra a que os tenho chamado”. E a consequente imposição de mãos, seguida da ação registrada no verso seguinte: “…e os enviaram”. Parece-me resumir-se num eficaz binômio: Ao Senhor cabe chamar, e à Igreja, reconhecer e enviar.

A formulação “Separem-me, separem para mim” , outro tanto, é forte indicador de que o chamado que Dele vem, faz do escolhido um servo para Ele, com exclusividade.

Vale pontuar: Sua igreja está dentro desse santo parâmetro? O Espírito de Deus nela tem despertado alguma vida para sair por Ele? E ela tem enviado? Quando o Espírito de Deus tem liberdade na igreja, desperta visão missionária, e dá conteúdo a essa visão.

Carismas 3 Caráteres -1 | Atos De Discípulos (19)

“Na igreja de Antioquia havia profetas e mestres: Barnabé, Simeão, chamado Níger, Lúcio de Cirene, Manaém, que fora criado com Herodes, o tetrarca, e Saulo. Enquanto adoravam o Senhor e jejuavam, disse o Espírito Santo: “Separem-me Barnabé e Saulo para a obra a que os tenho chamado”. Assim, depois de jejuar e orar, impuseram-lhes as mãos e os enviaram.”- Atos 13:1-3

A mim, causa admiração como um texto tão curto pode conter tanta riqueza de informação inusitada e tanto dinamismo espiritual.

A começar pela citação desse homem, Manaém, contado como um dos profetas ou mestres da igreja de Antioquia, aquela mesma que acabamos de ver anteriormente como o berço do título dos seguidores de Cristo. Talvez Manaém reunisse em sua pessoa os dois ministérios de uma vez: mestre e profeta, o que seria perfeito. Por que destacamos Manaém? Por conta da informação que Lucas acrescenta ao seu nome, com isso chamando a atenção para sua relevância no grupo. Ele foi criado como irmão adotivo de Herodes Agripa. Em Roma, desprezava-se a nova doutrina, reputando-a como religião de servos, escravos. Contrariando isso, só nesta relação de líderes de Antioquia temos Barnabé, o próspero; Saulo, o sábio; e agora somos informados de que Manaém era da casa do rei Herodes, tendo sido criado com ele.

Saber quem e como foi Herodes, e o texto de Atos anterior a este o descreve como o tirano assassino de cristãos, vazio de todo e qualquer temor a Deus -tendo por isso mesmo sofrido um fim nada invejável como consequência de juízo divino -acentua o valor de Manaém, que tendo vivido sob as mesmas influências do mesmo ambiente, não foi impedido de converter-se num destacado e carismático servo do Senhor Jesus. Manaém no palácio de Herodes, à semelhança de Moisés na corte de Faraó, a despeito de toda aquela opulência e luxúria, foi encontrado pelo Espírito de Deus que o chamou à fé em Cristo. Não somente foi convertido, quanto cresceu na graça de Deus. Seu nome era um correlato grego para o nome de Barnabé. Barnabé significando filho da consolação, em hebraico, ou filho do profeta, da exortação; e Manaém, consolação. Embora neste grupo fiquem em destaque Barnabé e Saulo, por certo Manaém estava nivelado a eles em valores espirituais.

Em seguida, somos informados de que Manaém se juntava a Saulo, Barnabé, Simeão Níger e Lúcio para adorar a Deus com jejum. Era prática corriqueira entre eles o jejum na oração, porque o Espírito de Deus comunica a eles Sua vontade enquanto o fazem, e depois de conhecê-la, voltam ao jejum e oração para cumpri-la. Caráter espiritual, acima de prática. O que distingue uma prática ensejada por um carisma como celebração que define caráter espiritual, é a perseverança de seu comprometimento.

Carisma sem caráter é possível, mas ele não prevalece, porque a perseverança é moral. O carisma sem caráter dura o tempo de um culto, como um êxtase ou uma crise emocional. Mas quando o caráter espiritual está formado, então há mais que um momento, mais que um culto. Há uma forma permanente de viver as realidades espirituais, daí aqueles homens aqui apontados como adoradores que jejuavam. Não o faziam para a busca de um acontecimento, pois o Espírito de Deus serviu-Se dessa busca para comunicar Sua decisão, com certeza surpreendendo o grupo. E uma vez conhecida, ela foi cumprida sob os mesmos parâmetros de sua prática de fé. Adorar, orar e jejuar, era-lhes rotineiro, houvesse manifestação carismática ou não. A leveza com que Lucas descreve o ambiente testifica disto.

Destaca-se como pilares desse caráter por dentro do carisma, disciplinas de pouco uso hoje, ou quase desuso: oração, adoração, jejum e imposição de mãos, esta como um ato de cumplicidade espiritual para cumprir a soberana vontade de Deus.

Acredito que discípulos hoje, sobre tais pilares, conheceriam a mesma manifestação carismática que o Espírito de Deus estaria à vontade para operar. Se Ele pôde encher a vida de um Manaém criado no nicho da mundaneidade e riqueza, quanto mais não faria com vidas simples como nós?