Onde Ele Está?

Minhas lágrimas têm sido o meu alimento de dia e de noite, pois me perguntam o tempo todo:      ‘ Onde está o teu Deus?” – Salmo 42:3.

 

O salmo 42 continua sua mensagem no salmo seguinte, no mesmo tom de um coração aflito, sedento por Deus, esta sede mais espicaçada pela angústia de alma, em busca de socorro espiritual. É tocante observar como a súplica desse crente corre exclusivamente pelas dimensões do espírito e não do temporal! É comum mesmo nos salmos, percebermos uma busca de Deus baseada em aflições temporais ou por causas temporais. Mas exclusivamente por conta de angústia da alma, é raro, mesmo na Bíblia. Pode até ser que num certo tempo houve causas físicas para essa aflição, mas o fato é que a este ponto sobrou apenas o que está interiorizado no homem.

É notório o espectro depressivo no lamento, especialmente quando lemos os vv. 5, 6 e 11 que o salmo 43:5 repete: “Por que você está assim tão triste, ó minha alma? Por que está assim tão perturbada dentro de mim?”

Ocorre que o salmista no seu lamento levanta para nós um ponto muito comum em nossa carreira de comunhão com Deus: a atonicidade da fé quando nos parece que Deus sumiu de cena. E tanto na experiência dele quanto na nossa, é nesses momentos que nosso coração nos brinda, repetindo a questão que outros se apressam em lançar em nosso rosto, até mesmo com a intenção de nos ajudar: Onde Ele está? Onde Ele está agora quando mais preciso dEle e só Ele pode ajudar?

Penso nos muitos momentos históricos registrados na Bíblia, pontuando a caminhada de homens e mulheres de Deus, quando essa questão pareceu ter vez. Desde os dias de Noé, construindo a arca sob o deboche de seus observadores, décadas a fio, depois de o ouvirem repetidamente dizer que Deus o mandara construir aquela inusitada peça por conta de um dilúvio exterminador que estava por vir.

Lembro Abraão vendo os anos passarem, sua velhice tornando-se num alquebramento de todas as esperanças em direção ao nada de uma promessa que tornava ridícula sua fé. Onde estava Aquele que prometeu? Teria Abraão sido deixado a sós com sua fé na promessa?

Lembro de José, desde a cova seca onde o lançaram seus irmãos, ao calabouço da prisão do Faraó, talvez rememorando os sonhos-profecia de sua exaltação em poder e força.

Os momentos que antecederam a travessia do Mar Vermelho na rota de fuga do povo de Israel, com um exército inimigo no seu caminhar, era legítimo para a pergunta: Onde Ele está? O que acontece agora?

Daniel, jogado aos leões numa cova fétida, tampada para ser envolta em trevas. Outro tanto seus companheiros já à boca da fornalha para serem queimados vivos: Onde Ele está?

E que dizer de Paulo e Silas na cadeia em Filipos, presos ao tronco? E Pedro acorrentado entre várias sentinelas aguardando a execução que era sentença inevitável?

E quantos mais? Saltam eventos extraordinários em nossa memória! Mesmo Jesus no deserto, quando Satanás o tentou para levá-lo a uma perda de posição.

Para cada situação dessas, a questão era a mesma: Onde Ele está? Tanto por quem as sofria, e mais ainda da parte de seus observadores. Quantas vezes esta questão foi feita pelo coração desesperado de Jó?

Quantas vezes fomos acometidos por elas?

E quando ocorrem, quais as respostas cabíveis?

Pretendo pensar apenas duas, que nos servem suficientemente.

A primeira nos é dada pelo próprio salmista. Ele contempla o estado de sua alma em frangalhos, e a exorta: “Ponha a sua esperança em Deus!” (42:5,11 e 43:5). Está na única direção que a fé aponta: Seu Autor. Exatamente nos trilhos do que disse Oséias 12:6 – “No teu Deus espera sempre”. Não há outra via para a fé. Foi dito a seu respeito que Jesus é Seu autor e consumador. A fé vem dEle e volta-se para Ele. Jeremias em circunstâncias semelhantes nos ensinou o que fazer: “Ponha o seu rosto no pó; talvez ainda haja esperança” (Lamentações 3:29) e isso depois de ter afirmado: “Lembro-me da minha aflição e do meu delírio, da minha amargura e do meu pesar. Lembro-me bem disso tudo, e a minha alma desfalece dentro de mim. Todavia, lembro-me também do que pode me dar esperança: Graças ao grande amor do Senhor é que não somos consumidos, pois as suas misericórdias são inesgotáveis” (Lamentações 3:19-22). E então vale lembrar: O amor de Deus é eterno. As vicissitudes não provam que cessou ou que estamos sendo menos amados, porquanto sofremos.

Mas há ainda outra resposta e esta nos esclarece ao mesmo tempo que nos compromete: e está baseada no compromisso de nossa visão pessoal de Deus, aquela que a forma como nutrimos nossa fé, nos delineou. Atende justamente à proposta da questão: Onde Está o teu Deus?

Biblicamente a única resposta cabível é a que pressiona na direção em que devemos buscá-Lo: No céu. Exatamente como ensinou o Senhor Jesus: “Pai nosso que estás nos céus”. E aqui despontam dois fatos relevantes: Ele é o Deus que deve ser buscado no Alto. Que está elevado, acima de tudo. Superior. Não distante. Isso não fala de geografia mas de estado espiritual. Somos nós que insistimos na geografia, querendo dar visibilidade aos atos de Deus para que nossa fé possa crer, mas isso vai na contramão da proposta: “se creres verás” ou: “andamos por fé e não pelo que vemos”. No céu. Como concluiu o salmista: “A Ti levanto os meus olhos, a Ti, que ocupas o Teu trono nos céus”(Salmo 123:1). E sempre foi onde O buscaram os que estavam em aflição. Daí Isaías dizer: “Porque assim diz o Alto e o Sublime, que habita na eternidade, e cujo nome é Santo: Num alto e santo lugar habito; como também com o contrito e abatido de espírito, para vivificar o espírito dos abatidos, e para vivificar o coração dos contritos” (57:15). Outro tanto disse o salmista: “Do Seu santuário nas alturas o Senhor olhou; dos céus observou a terra, para ouvir os gemidos dos prisioneiros e libertar os condenados à morte” (102:19 e 20).  E quando a fé se permite esta certeza, ela nos levanta na direção dEle, como também declarou o autor do salmo 130: ” Das profundezas clamo a Ti, Senhor”. Resta se elevar.

E o outro fato que mais depreendemos na oração do Pai nosso, é que jamais nossa fé deve desistir da consciência de que no céu, o Deus a Quem buscamos ocupa o lugar de Pai a nosso favor. Temos em Deus o Pai das alturas. E nessa qualidade de Pai Ele está pronto a nos achar quando fazemos como também Jesus ensinou: “Entra no teu quarto, fecha a tua porta sobre ti e ora em secreto ao Teu Pai que vê em secreto, porque Ele te ouvirá”. Glória ao Seu nome!

Deus não perde posição em nossas vidas. O salmista nos ensina ainda que Ele está num coração quebrantado e contrito.

Quando sua mente ou mesmo outra pessoa questionar: Onde Ele está?, por conta do aturdimento das circunstâncias, diga como o salmista: Ele está no céu de onde me virá o socorro, ou diga como o mesmo salmista: Ele está em minha angústia, angustiando-Se comigo. Ou ainda você pode dizer com a autoridade de Jó: “Eu sei que o meu Redentor vive, e por fim na minha carne O verei”.