Passos Sobre as Amoreiras

Qualquer de nós, crentes em Jesus, gostaria de viver a realidade das promessas exaradas no salmo 121, o mais literalmente possível: “O Senhor protegerá a sua saída e a sua chegada, desde agora e para sempre” (v.8). Andaríamos mais tranquilos, mais confiantes, nestes tempos em que segurança é luxo relegado ao passado remoto. Andaríamos mais garantidos quanto a mais acertos, menos erros.

Qualquer de nós gostaria de poder viver mais realisticamente a experiência de se saber orientado por Deus em cada empreitada da vida.

Houve um dia em que Davi, rei de Israel, recentemente empossado no trono, viu-se sob ameaça de ataque fulminante de seus inimigos figadais, os filisteus. Estes arquitetaram seu plano de ataque e Davi se mobilizou para o contra-ataque. E este, carecia de estratégia bem feita, planejamento seguro, para que a empreitada não derreasse em fracasso. Fracasso significaria chacina de seu povo. E Davi buscou o seu Deus em oração. De que ele precisava? Saber se o Senhor lhe daria vitória, e saber como atuar nessa campanha. Deus lhe responde e garante vitória. Deus assume cumprir a promessa do salmo 121, de forma literal e plena. Mas restava saber quando e como. Ouvir a promessa e crer nela é até fácil, mas saber usá-la é difícil. Então Deus o auxilia orientando ao quando e como, dizendo: “Assim que você ouvir um som de passos  por cima das amoreiras, saia para o combate, pois este é o sinal de que Deus saiu à sua frente para ferir o exército filisteu”(1 Crônicas 14:15).

E eis aí um fato extraordinário! Não existem passos sobre amoreiras. Ninguém caminha sobre árvores, mas Deus criou este artifício como a dizer a Davi: “Volte sua atenção para as alturas, para Mim que habito no Alto”. Também significaria ouvir em cima, os sons do Alto. Isso é pertinente a nós também.

Como bom estrategista de guerra e experimentado nos combates, Davi estava acostumado a ficar atento aos movimentos do inimigo, ali, no terreno ao pé de si. Acostumado a ouvir os ruídos dos fatos, a observar os sinais óbvios, previsíveis, para poder agir, precaver-se, atacar. Ouvir som de passos sobre amoreiras, era tão incomum quanto absurdo. Mas os sons divinos tendem ao incomum e absurdo, porque não são previsíveis.

Outro tanto nós somos exortados por Deus a expectar os sons das alturas, Seus ruídos que nos sinalizam o momento de avançar, de proceder. Estamos sempre tendentes ao óbvio, visível, controlável. Humano, nosso. Mas Deus nos desafia a ouvir os sons inéditos que só a fé alcança, ruídos do impossível em termos humanos, sinalizadores de que Ele Se movimenta junto a nós, e por Cima, desde o Alto, de onde tudo é possível. Em outras palavras, somos concitados a elevar nossa atenção dos sentido temporais, perceptíveis por nossos sensores orgânicos, para aqueles  que só a fé consegue ouvir. Para Davi, ouvi-los significava segurança, garantia, e coragem. Não menos ocorrerá comigo e você, sempre que crermos que nosso Deus “sai à nossa frente” para fazer e acontecer.

Na verdade, nossa tendência é forçar a fé a ouvir “embaixo”. Ou queremos que ela nos leve ao limiar da fantasia, do mágico. Isso não é ouvir no alto. Quando Deus move Seus passos para nos encorajar, os ruídos podem parecer o som de galhos que se dobram, que se partem, ou seja, os sons que contrariam expectativas. Mas, que por sua vez, só podem ser percebidos se nos colocamos atentos. Pedimos que Deus nos responda, nos oriente? Então aguardemos os ruídos de Sua resposta. Eles virão. Havia a determinação de um tempo de espera para Davi. “Até que ouvisse o som”. Habacuque também decidiu parar para ouvir a voz de Deus, assumindo ficar sobre sua torre de vigia até “ouvir o que Deus dirá”.

Ouvir os passos de Deus vindos do Alto, é ouvir o que ultrapassa o nosso entendimento. Ele tem multiformes maneiras de usar veículos e recursos humanamente imprevisíveis, mas eficazes, que nos corroboram a esperança e a certeza de que a resposta está vindo de Sua Presença. Ele jamais deixa de responder.

Conta-me a Velha História

Um dos clássicos hinos da hinologia cristã, imprime um apelo à fé que nos toca, quando o poeta diz: “Conta-me a velha história”.

Há um texto na Bíblia, o livro de Deus que relata a mais atual e atuante velha história, onde um rei se assenta para ouvir o relato de histórias, na ocasião não tão velhas, mas de feitos passados de um grande profeta de Deus. O texto se encontra em II Reis 8:4 – “O rei estava conversando com Geazi, servo do homem de Deus, e disse: “Conte-me todos os prodígios que Eliseu tem feito”.Presume-se que este rei era Jeorão, irmão de Acazias e filho de Acabe. Se de fato tratava-se de Jeorão, estamos diante de um rei ímpio, mas que guardava um certo temor ou respeito pelo Deus do profeta, pois embora fosse idólatra, procurou exterminar com vários núcleos de culto a Baal, que sua mãe, a terrível Jezabel, havia feito proliferar na nação. E aqui ele surpreende revelando um inédito perfil: parava para ouvir falar das velhas histórias sobre os feitos do homem de Deus. E requisitou ninguém menos do que o auxiliar imediato daquele profeta, para que ouvisse de viva voz a narrativa por uma testemunha ocular dos milagres.

Chama a minha atenção o fato de um rei idólatra mostrar interesse por coisas espirituais alusivas a um culto que ele não praticava, e mais: separar tempo para isso, em meio ao caos que estava instalado na nação ao seu redor.

Ninguém especulou até hoje qual ou quais possam ter sido as motivações do rei. Pode ser que não passasse de curiosidade por fenômenos do mundo transcendental. Pode ser que quisesse se inteirar de fatos que viessem cativar a sua fé. Pode ser que estivesse movido por necessidade de conferir as verdades das profecias cujos efeitos ele testemunhou, com os milagres do profeta que as proferiu. Razões podem ser muitas. Nunca saberemos. Mas há algo que podemos considerar e reside no simples fato de um soberano de uma nação, parar para ouvir relatos de uma fé que ele não domina. Interesse é a palavra que desponta.

Enquanto o rei ouve a narrativa, a principal protagonista do mais extraordinário dentre os milagres, entra em cena e com sua presença corrobora a narrativa e ainda referenda outro milagre, pois era ela a sunamita cujo filho Eliseu ressuscitara, e surgia ali para reivindicar do rei a posse de suas terras que haviam sido confiscadas, depois que ela as deixara para escapar de uma fome de que fora previamente informada pela profecia de Eliseu.

Ocorre-me que todos nós, crentes hoje no Deus de Eliseu, cremos porque assumimos como verdadeira a velha história que a Bíblia nos conta, “de Cristo e Seu amor”. E que nos foi narrada por testemunhas oculares de seus fatos. E cremos porque, conquanto velha, ela se renova em nossas entranhas e em seus efeitos em nossas vidas, quando nela cremos, tal como a presença da sunamita durante o relato, renovava a realidade dos fatos e seus efeitos, no conhecimento do rei.

A história da fé cristã sempre será a Velha História. Nossa segurança para crer e confiar, reside no fato de ser tão velha que se pôde provar no decurso dos séculos, e também porque embora velha como história, faz-se atual por tão remotamente ter apontado o futuro que nos alcança hoje e ainda vai além para nos dizer que, tão certo quanto ela se cumpriu nos séculos que a sucederam e nos precederam, tão certo ela se cumprirá quando nos diz o que nos espera adiante. E a Velha

História, de geração em geração avisa que um Novo Dia haverá, em que a história vai parar, vai chegar ao seu termo para recepcionar o Senhor da História que irromperá nela para refaze-la, e renová-la para ser vivenciada por aqueles que pela fé Nele, forem feitos novas criaturas. E por ser muito velha esta história, é certo que o futuro por ela apontado há tão longo tempo, está mais perto de nós do que jamais pensamos.

Maranata!