Esterco e (é) Vida

“…Um homem tinha uma figueira plantada em sua vinha. Foi procurar fruto nela, e não achou nenhum. Por isso disse ao que cuidava da vinha: ‘Já faz três anos que venho procurar fruto nesta figueira e não acho. Corte-a! Por que deixá-la inutilizar a terra?’ Respondeu o homem: ‘Senhor, deixe-a por mais um ano, e eu cavarei ao redor dela e a adubarei. Se der fruto no ano que vem, muito bem! Se não, corte-a!” – Lucas 13: 6-9.

E aí estamos nós. A figueira intencionalmente plantada na vinha. Sim, porque a vinha é para produção de uvas. Mas uma figueira foi posta nela. Isso já diz muita coisa: o dono da vinha quer variar o cardápio, e escolheu uma planta predileta (“propriedade peculiar de Deus”). Três anos depois vai em busca do resultado do plantio, pela terceira vez seguida o faz, e nada encontra. (Segundo os estudiosos, esse na verdade seria o sétimo ano da árvore, porque os agricultores esperam os primeiros quatro anos desde o plantio para então buscar seus frutos). E, olhando a planta que o frustra, decide acabar com ela. Lamenta o fato de que uma vez na terra, ela não se serviu do espaço para responder com frutos.

Mas um mediador intervém e apela: “Deixe que eu cave, coloque estrume. Mais um ano e veremos se dá fruto. Dê mais um ano a ela, mais uma oportunidade!”

Para quem serviriam os frutos da figueira? Para ela mesma ou para quem a plantou? Resposta óbvia. Mas houve uma busca pelos frutos. “Eu os escolhi para que vocês dêem frutos que permaneçam”. Lembram?

Diante da ausência de frutos há uma drástica decisão: “Que desocupe o espaço que foi tornado inútil!”

O intercessor suplica: “Suporte mais um ano, enquanto trabalho nela”.

E cava ao seu redor. Abre valas. Parece fazer covas, expõe as raízes, os meios de sustentação e garantia da árvore. Ela se alimentava de água e sol, mas agora outro nutriente lhe é acrescentado, preenchendo as covas e cobrindo as raízes: estrume. Alguém diria: Não seriam fertilizantes, refugos? Algo mais simpático como o disse Paulo em Filipenses 3:8? Não. A palavra empregada por Lucas para registrar o que disse Jesus não é nada simpática: estrume. Estrume como adubo será dado à figueira para que ela reaja a fim de dar frutos. E isso é uma extensão da tolerância, da boa vontade do senhor da vinha que atende ao apelo do mediador. É graça.

Estrume é palavra que no original tanto se refere ao excremento animal quanto ao humano, fezes, e se associa, na linguagem do Velho Testamento, à ideia de coisas amargas. Mas quanto à figueira, fala daquilo que reputado por refugo, dejeto, rejeitável, traz em si um mundo de elementos vivos, insumos que pululam de vida e podem nutrir a figueira para que frutifique, uma vez que não o fez só pelo espaço de terra no qual foi plantada.

Quantas coisas reputamos por refugo? Coisas que desprezamos; pessoas que reprovamos, depreciamos. Situações que rejeitamos e decisões que descartamos porque não nos agradam! Conceitos que excluímos.

Pois é dessas coisas que Se serve o Mediador para nos levar à frutificação, a fim de que permaneçamos pelos nossos frutos. Coisas que receberemos se permitirmos espaços entre nós e nossas raízes, as covas do perdão, da conciliação, da aceitação, da inclusão, da… E o estrume consiste em tornar nosso coração nesse trapo que serve para cobrir tudo isso e muito mais.

Quem tem ouvidos…ouça. O Mediador nos quer frutificando e permanecendo por meio de nossos frutos.