Palavra ou Profecia?

Não é a minha palavra como o fogo, pergunta o Senhor, e como um martelo que despedaça a rocha?” – Jeremias 23:29.

O contexto desta profecia acusa o ministério profético de Jerusalém dos dias de Jeremias, todo comprometido com a falsidade e o engano da parte de profetas que diziam o que o povo gostaria de ouvir. No contexto, em que Deus condena esse exercício promíscuo do ministério deles, Ele cita as palavras que revelam o caráter sedutor de suas profecias: “Não ouçam o que os profetas estão profetizando para vocês; eles os enchem de falsas esperanças. Falam de visões inventadas por eles mesmos, e que não vêm da boca do Senhor. Vivem dizendo àqueles que desprezam a palavra do Senhor: Vocês terão paz. E a todos os que seguem a obstinação dos seus corações dizem: Vocês não sofrerão desgraça alguma” (23: 16-17).

Com isso o Senhor acusa tanto o povo que corre para ouvir o engano quanto aqueles que lhes profetizam enganosamente. É então que sobressai a mensagem expositora do cerne funcional da Palavra de Deus como de fato é, e quando proferida como Verdade: fogo e martelo.

Com estas duas metáforas o Senhor pretende contrastar o verdadeiro do falso: Fogo, e martelo que despedaça a rocha.

Quando penso nestas duas metáforas sou levado a pensar na praticidade desses efeitos aludidos por Deus. Ele afirma: “Minha palavra é como fogo, não é?”. E o afirma em tom de questionamento. E isso para dizer que o efeito de ouvir a Palavra de Deus proclamada em verdade seria semelhante ao efeito do fogo. O que o fogo faz? Ilumina, aquece, purifica e destrói. A Palavra de Deus tem exatamente esse caráter a cumprir. “Lâmpada para meus pés é a Tua Palavra, Senhor, e luz para o meu caminho”(Salmo 119:105) – experimentou e celebrou o salmista. “Não estava queimando o nosso coração, enquanto Ele nos falava no caminho e nos expunha as Escrituras?” (Lucas 24:32) – conferenciavam os dois discípulos de Jesus, por Ele abordados no caminho de casa. “Vocês já estão limpos pela Palavra que
lhes tenho falado” ( João 15:3) – disse Jesus aos discípulos. Mas também ouvimos dizer que ela destrói, e neste quesito onde também ela além de fogo se associa à idéia de martelo, há inúmeros textos que não precisamos citar aqui. Abundam nos salmos.

No tocante a martelo que despedaça a rocha, é gratificante pensar nela como o poder de Deus que derruba as estruturas mentais erguidas pela incredulidade humana: “As armas com as quais lutamos não são humanas; ao contrário, são poderosas em Deus para destruir fortalezas.” (2 Coríntios 10:4), e a referência de Paulo é quanto ao uso da Palavra de Deus. Destruindo o endurecimento do coração empedernido que resiste por conta do pecado, como no encontro de Jesus com Zaqueu, e outro tanto com o endemoninhado de Gadara. Mas as imagens por serem inerentemente fortes, não foram tomadas por Deus como referências funcionais de sua Palavra para apontar eventos ocasionais. Não. Elas entraram aqui para se contraporem às blandícias dos pregoeiros que se servem de citações e manipulações escriturísticas e proféticas, para agradar e atrair seus ouvintes. Foram usadas pelo Senhor da Palavra para afirmar categoricamente, mais que comparativamente, que Sua Palavra de fato é fogo e martelo, que quem se envolve com ela vivencia esse seu poder e eficácia, seja pelo fogo de juízo contra o mal e o pecado, seja pelo martelo que arrebenta com conceitos e pré-conceitos e preconceitos para cumprir- se no esteio da vocação de Jeremias: levantado por Deus para derrubar estruturas engendradas pelos homens, contrárias ao plano divino. E, por acréscimo, havendo vivido os efeitos da Palavra como fogo e martelo, ainda nos confrontamos com seu caráter de “espada aguda de dois gumes, que penetra até à divisão da alma e espírito, e que é apta para discernir (cortar em dois o cerne) das intenções do coração” ( Hebreus 4:12).

Que ninguém se deixe enganar: Se a palavra ouvida como de Deus, nada achou para queimar, despedaçar ou cortar em quem ouve, não foi Palavra de Deus. “Com soberba falou o tal profeta”.

“Sentido de Reino”

Pois o Reino de Deus não é comida nem bebida, mas justiça, paz e alegria no Espírito Santo; aquele que assim serve a Cristo é agradável a Deus e aprovado pelos homens.” – Romanos 14:17-18

Vivemos no mundo físico, no qual cogitamos de coisas concretas e nos servimos dos sentidos do corpo para realizarmos a vida.

A Palavra de Deus ao nos ensinar que passamos a pertencer a um reino espiritual que se opõe ao mundo físico, não nos mandou alienar-nos dele. Pelo contrário, ensinou-nos a nos investirmos do que passou a ser real para nós, a fim de influirmos com seus valores naquilo que é transitório e temporal. A Verdade diz: “Ele nos libertou do império das trevas e nos transportou para o reino do Filho do seu amor” – Colossenses 1:13.

E a ordem é esta: No terreno da fé nos servimos dos valores do Reino onde agora estamos inseridos espiritualmente e que ocupa o nosso pensamento, para trazer esses valores através de nossa experiência à realidade física que nos cerca.

Não podemos, como crentes em Cristo, inverter essas posições sem nos confundirmos e desesperarmos. Estamos no mundo, mas diz o Senhor, que não somos dele (João 17:16). E aí reside a abissal diferença entre ser e estar. Quando estou, navego nos limites do visível e só me sirvo de meus cinco sentidos físicos. Quando sou, e se isso significar SER no Reino, posso transitar para além do físico e dispensar meus sentidos, porque uso de ferramentas espirituais: a fé, no lugar da visão; o coração (não o órgão, mas a sede de minha vontade determinante) no lugar da audição. E o tato, o olfato e o paladar, não me servem nesse ambiente invisível. As emoções que costumam atender exclusivamente aos sentidos físicos e à memória, agora podem deixar-se disciplinar e depurar sob influência das ferramentas do espírito.

Eis a razão por que o apóstolo Paulo neste monumental capítulo 14 de Romanos postula sobre a relatividade do que se permite e do que se proíbe
no terreno do táctil e paupável, (14: 2-6, quanto ao que se come e ao que se bebe; quanto ao que se celebra ou não) quando a motivação de tudo é o Senhor e Seu Reino. Se Sou do Reino, até o comer e o beber são para Ele, em Sua honra e culto. Se estou seguro de que SOU, onde ou como ESTOU estarão sujeitos a essa primeira posição. O que sou dita como e onde estou, quando eu SOU NO SENHOR, nas esferas do Seu Reino. É disto que Ele fala em 14:7, e arremata em 14:17 nos mostrando as evidências, ou sinais que vão testificar de quando SOU do Reino e pró-Reino: Justiça, paz e alegria no Espírito Santo.

A experiência de ser investido pela fé da justiça de Cristo, opera paz (com Deus, consigo e com outros – Romanos 5:1) e o resultado é alegria no Espírito Santo. É importante atentar e ressalvar a preposição: alegria No Espírito Santo e não apenas DO Espírito Santo, pois a diferença está em ser e não estar. Não se trata da alegria estado emocional, que opera nos sentidos, mas a que opera no íntimo do ser, que dispensa e ultrapassa os ditames das circunstâncias e pode servir-se ou não dos sentidos físicos.

Estes sinais são os indicativos do verdadeiro lugar que ocupamos estando no mundo: Somos do Reino, por ele afetados e com ele comprometidos, ou somos do mundo, pretendendo que o Reino em mundo se torne. Esta inversão de valores é inconcebível.

“Porque Teu é o Reino, o poder e a glória para sempre…” Amém.

Contrastes

Assim diz o Senhor: “Maldito é o homem que confia nos homens, que faz da humanidade mortal a sua força, mas cujo coração se afasta do Senhor. Ele será como um arbusto no deserto; não verá quando vier algum bem. Habitará nos lugares áridos do deserto, numa terra salgada onde não vive ninguém. Mas bendito é o homem cuja confiança está no Senhor, cuja confiança nele está. Ele será como uma árvore plantada junto às águas e que estende as suas raízes para o ribeiro. Ela não temerá quando chegar o calor, porque as suas folhas estão sempre verdes; não ficará ansiosa no ano da seca nem deixará de dar fruto”.
Jeremias 17:5-8

Passamos a existência desejando e escolhendo. Isso vale para o crente e para o que não crê em Cristo. Mas, como em muitas outras áreas, uma diferença se acentua entre um e outro quando se trata de fazer escolha a partir de uma plataforma espiritual.

É disso que fala o Deus de Jeremias, usando de uma metáfora viva, ao comparar o homem à árvore, metáfora muito recorrente nos escritos do Velho Testamento e de que também se serviu o Senhor Jesus falando de Si e Seu rebanho de seguidores.

Mas, voltemos à plataforma referida. Ela é ou tem um eixo. O eixo está visto no verbo confiar ou no vocábulo confiança. Dependendo do lado para o qual fazemos o eixo inclinar, os resultados das escolhas mudam. É desafiador.

Se optamos por confiar na capacidade e recursos de nossa humanidade pessoal ou geral, contraímos maldição. Se nossa opção for o Deus Invisível e Verdadeiro, contrairemos bênçãos, ou seremos benditos, abençoados.

Se a opção for o braço da carne, visível e sob nosso controle, teremos nossa vida ou existência comparada ao arbusto do deserto, sem raiz e sem garantias futuras. Se a opção for a vontade de Deus e nossa dependência nEle, seremos comparados a árvore plantada junto a ribeiros. Simples assim. Aí está toda a analogia.

Mas paremos sobre os significados da metáfora.

1- O Homem como Arbusto
– Ele se garante porque suas referências são visíveis e comuns a todos. Mas seu eixo, visto na direção de seu coração, o afasta de Deus. Quanto mais próximo aos poderes mundanos, mais distante seu coração fica do poder de Deus.
– Em consequência sua existência é na aridez espiritual, comparada a deserto e solo salgado. Sabemos que o deserto ou a aridez são ambientes próprios a Satanás, conforme relatos da Bíblia. Em outras palavras: solidão. Ele está só e não se apercebe disso até que o sal do solo cobre a sede.
– E porque é árido o chão de sua existência, ele não vê o bem. O que significa isso? Isto fala de falta de discernimento, falta de capacidade de ver as coisas positivas, boas, como tendo procedência divina, providência de Deus. E se nelas ele não pode ver Deus, resta o desespero de tratar as coisas como finitas, esgotáveis, passíveis de extinção.
– Ele é tido por maldito.

2- O Homem como Árvore
– Sua garantia está no Senhor. Ele vê o invisível e por isso mesmo tomamos como exemplo, Moisés (Hebreus 11:26). Seu coração corre para Deus, o aproxima, porque Dele depende. É como um animal domesticado, que faz do seu dono o centro de sua gratificação, sua fonte.
– Em consequência sua existência tem raiz: como árvore plantada junto às águas e as bases de sua existência procuram se aprofundar em busca dos lençóis freáticos. Essa fonte é Jesus. Percebe a imagem da metáfora? Raízes que se aprofundam em busca da fonte. Jesus é buscado nos recônditos do intimismo.
– Então a metáfora cresce para mostrar o primeiro fruto da confiança: enquanto o arbusto “não vê”, a árvore “não teme”. E o que ela não teme? As possibilidades comuns a todos: os tempos de estio. Mesmo quando tudo seca, suas folhas ficam verdes. Isto fala de promessa de frutificação, como a dizer: continuo dando fruto de fé, embora o contexto ameaçador. Conhecemos esta linguagem em Habacuque 3:7 e 18: “Mesmo não florescendo a figueira e não havendo uvas nas videiras, mesmo falhando a safra de azeitonas e não havendo produção de alimento nas lavouras, nem ovelhas no curral, nem bois nos estábulos, ainda assim eu exultarei no Senhor e me alegrarei no Deus da minha salvação.”
E então vem o reforço: “Não ficará ansioso”. O mais eloquente e convincente sinal de quem confia. O mais retumbante brado de louvor a Deus: nenhuma ansiedade porque conhece sua fonte sustentadora e sabe que ela não se esgota.

– Ele é tido por bendito. Bendito ou abençoado do Senhor. A razão: confiança. Confia quem conhece.