Nosso texto-base para reflexão hoje, na Palavra de Deus, se encontra em Gênesis 21:8-20, onde leremos sobre o banimento feito por Abraão, de Hagar, a escrava egípcia, e seu filho Ismael.
O texto nos servirá como inspiração para o desenvolvimento do tema que desejo compartilhar com você, a favor de nossa fé, nesta oportunidade.
Hagar foi arrancada de uma posição de conforto e até privilégio, e lançada para um extremo oposto de suas expectativas e esperanças. Lançada em direção a um deserto físico, que ao mesmo tempo assumia o lugar do deserto de sua frustração e desdita. E é neste sentido que devemos pensar na possibilidade e realidade desses desertos figurados na jornada de muita gente.
Primeiramente, devo esclarecer o fato de que há uma sensível diferença entre o que hoje reputamos por deserto, e as inúmeras referências a desertos dos cenários bíblicos da antiguidade. Ainda que hoje prevaleçam alguns daqueles desertos nos termos em que os entendemos, muitos deixaram de ser desertos à medida em que foram povoados, pois maioria das vezes, a palavra deserto na Bíblia configura lugares ermos, inabitados, mas que tinham vegetação, água e até mesmo constituíam oásis paradisíacos. No entanto, sua localização remota de tudo, fazia deles um lugar de abandono e solidão.
Os desertos foram inúmeras vezes palcos de grandes realizações de Deus, na vida daqueles com quem Ele construiu a história da redenção.
À luz do deserto de Hagar, o deserto de Berseba, e a intervenção divina ali ocorrida, devemos pensar nas lições que esses desertos trazem para nossa fé. E por quê? Porque os vemos ocorrendo repetidamente na vida de muitos filhos de Deus em nossos dias, em especial diante da atual pandemia que tem vitimado tantas famílias, mas não só em função disto.
Todavia, é inevitável pensar em alguns desertos de aparente desamparo que vez por outra acomete alguns de nós. São momentos de transe; angústia que parece interminável; terrores na alma; sensação de abandono; desamparo; de afundar sem possibilidade de retorno ou momentos de desesperança que atordoam e levam a pânico. Os personagens do deserto de Berseba viveram exatamente esse coquetel de emoções atordoadoras: Hagar e seu filho. Banidos, partiram sem rumo e o pouco que tinham aprovisionado acabou, em meio ao nada. Atonicidade, desespero, lágrimas; ocupam a alma, alagam. A perspectiva, se havia, era morte trágica, muito sofrida. A alma levava também as cargas da mágoa que a injustiça se encarrega de criar, além da humilhação de ser descartada como coisa sem valor.
Isso nos faz pensar nos desertos modernos que assolam algumas vidas: quando desempregadas, em vias de falência, traídas, solitárias, abandonadas, doentes sem meios de prover sua restauração. E há ainda uma esteira de tantas outras situações, impossível de serem aqui enumeradas, mas que produzem efeitos semelhantes e configuram desertos particulares.
No deserto de Hagar, houve lugar para milagre, porque Deus estava no deserto. Ela apenas não via, e por isso não sabia. E Hagar e seu filho descobriram que Deus tem poder para construir no deserto. Interessante o fato de que Ele não os tirou do deserto em que estavam, mas operou lá, construiu nele as suas vidas, fez construção no seu deserto a partir dele a favor daquela pequena família. E isto nos leva a pensar: Quais os desertos possíveis de nos acometer e o que Deus pode neles construir? Deus se envolve em todos eles? Creio que temos resposta histórica desse agir do Senhor em Sua Palavra. Então começamos pela questão: Quais os desertos possíveis?
Já lemos sobre o deserto de Hagar. Eu vejo nele
1- O Deserto da Injustiça
Porque perpetrado pela vontade dos homens ou das circunstâncias. Ele é mais corriqueiro do que se pensa. Nele se enquadram o desemprego, as enfermidades oportunistas, os acidentes e também as catástrofes. É próprio hoje das famílias acometidas pela virulência do Covid-19. Tragédias sociais e domésticas também se enquadram aqui, que como no caso de Hagar, podem ter como agente até mesmo um justo, como foi Abraão.
Mas vale lembrar: Em seu desespero, tanto Hagar quanto o menino choraram, e o pranto do garoto subiu como uma oração a Deus. Porque foi um pranto diante de Deus e dirigido a Ele. Isto tem muito a nos ensinar. A súplica, o recorrer ao Altíssimo que sabe nos achar no ermo e devastação, ainda é o recurso suficiente para fazer desse deserto o palco do milagre. Deus entra no deserto e só Ele pode e tem poder para construir nele. Deus fez do deserto de Hagar e Ismael, o espaço da construção de um grande povo e suas cidades. Isto nos leva a pensar num outro tipo possível de deserto:
2- O Deserto da Provação (Disciplina) – provocado por nossa natureza contumaz.
Destaco apenas um texto: “A ira do Senhor acendeu-se contra Israel, e ele os fez andar errantes no deserto durante quarenta anos, até que passou toda a geração daqueles que lhe tinham desagradado com seu mau procedimento.” – Números 32:13. Para quem conhece a história bíblica, esse foi o longo deserto de peregrinação do Israel antigo: 40 anos, que poderiam ter sido apenas 40 dias de uma peregrinação difícil, mas curta.
Apesar da causa desse deserto, Israel aprendeu algo que é inesquecível. Que “as misericórdias do Senhor são a causa de não sermos consumidos”. Quantas vezes nossa precipitação, vontade afoita ou más sementeiras nos levam aos desertos da provação e das perdas! Mas ainda ali, eis a graça! Quantos milagres Israel vivenciou pela manifestação divina naqueles dias! Não faltou pão diário, ao longo dos 40 anos. Não faltou água, ainda quando tivesse de ser tirada da rocha. Não faltou carne. Não faltou presença manifesta de Deus, ora pela aparição da coluna de nuvem de dia, ora pela coluna de fogo à noite. Não faltou luta e vitória pelo braço do livramento de Deus. Não faltou ensino, orientação divina, Palavra, criação, construção, moradia. Ele fez. Era o espaço da provação, mas era assistida. Deus morou com Israel no deserto, cada um daqueles dias. Israel viveu a verdade preconizada em Deuteronômio: “Por baixo de ti estende os braços eternos”. Deuteronômio 33:27. Aleluia!
E um último aspecto a considerar de um deserto não só possível quanto necessário à nossa fé:
3- O Deserto da Capacitação
Antes de se apresentar ao povo de Israel como líder, Moisés viveu banido do Egito, 40 anos no deserto. Quero apenas lembrar esse deserto de 40 anos na vida de Moisés. Deus o fez resultar na revelação através da sarça no Horebe. “Moisés pastoreava o rebanho de seu sogro, Jetro, que era sacerdote de Midiã. Um dia levou o rebanho para o outro lado do deserto e chegou a Horebe, o monte de Deus. Ali o Anjo do Senhor lhe apareceu numa chama de fogo que saía do meio de uma sarça. Moisés viu que, embora a sarça estivesse em chamas, não era consumida pelo fogo.”- Êxodo 3:1-2. Moisés, depois que fugiu do Egito, viveu 40 anos no deserto, jornada que foi interrompida pela revelação de Deus a ele.
Em seguida, não podemos esquecer os 15 anos de fuga de Daví, vivendo nos desertos para sobreviver a seu inimigo Saul, e depois a seu filho traidor, Absalão. Quanto Daví aprendeu nesses desertos! Daví entendia de deserto já desde os dias em casa de seu pai quando ainda adolescente.
Daví venceu o gigante Golias no deserto;
Daví formou um exército de valentes guerreiros no deserto;
Construiu instrumentos musicais e compôs seus mais belos salmos ali;
Foi no deserto que ele encontrou uma esposa digna, Abigail, que havia enviuvado.
Foi no deserto que ele aprendeu a suportar, fortalecer-se, criar estratégias de guerra e vencer como herói.
Foi o deserto que lhe ensinou a gloriosa verdade do salmo 139: “Se fizer a minha cama no abismo, também lá estarás”.
Por último, temos Mateus 4 nos descrevendo o deserto preparatório do Filho de Deus, para onde foi Ele levado pelo Espírito Santo para ser tentado; onde experimentou vitória sobre o mal, e vivenciou conforto angélico, mas também de onde emergiu pronto para começar Seu ministério terreno.
Moisés, Daví e especialmente Jesus, nos ilustram os desertos onde Deus deles Se serve para capacitar, construir uma grande realização permanente. Todos esses desertos nos são possíveis, e de igual maneira também nós achamos nosso Deus neles.
Em cada um desses desertos com suas brilhantes histórias, temos os emblemas de nossos possíveis desertos pessoais. Em cada um deles aprendemos quanto Deus neles opera, constrói, de maneira que longe de ser o cenário de nossa destruição, eles são convertidos na arena de nossa vitória pelo operar gracioso do Deus Eterno que não nos desampara, cumprindo em nossas vidas a um só tempo, a Palavra que assegura: “Eu estarei com você” (Isaías 43:2) e: “pois os nossos sofrimentos leves e momentâneos estão produzindo para nós uma glória eterna que pesa mais do que todos eles.”– 2 Coríntios 4:17.
Você se acha no deserto? Não se desespere! Clame ao Senhor. Ele ouvirá e vai usar o seu deserto para transformação e bênção, por Sua graça. Ele entende de desertos. Louvado seja Seu santo Nome!