Pastoreio

Salmo 23; João 10:1-15.

Simbiose é uma palavra de uso pouco comum, cujo  significado  figurado é a associação íntima entre duas partes para auxílio mútuo. E diz-se, das partes simbióticas, que elas são ligadas por razões afins.

A Bíblia nos revela a mais bela ilustração de uma estrutura simbiótica, estrutura espiritual, no salmo 23, entre o pastor e a ovelha. Todo cristão que se entende como tal, consegue identificar-se neste salmo como sendo uma ovelha, e Jesus como seu pastor, e isto devido ao texto de João 10 em que o Senhor Jesus Se anuncia como pastor de ovelhas.

Mas saber tais coisas não constitui uma simbiose. O que se destaca no salmo 23, é que o seu autor adora a Deus se sentindo uma ovelha, posicionando-se como ovelha, diante dAquele a Quem reconhece e confessa como seu pastor, de forma efetiva e real.

A linguagem se reveste de uma beleza espiritual, que na tradução do Espírito Santo para nós, torna-a profética para a nossa fé.

Outro tanto, é importante a leitura de João 10, para que o sentido  dessa simbiose fique pleno.

Primeiramente, desejo destacar a auto-visão desse homem de fé, o salmista, vendo-se como ovelha. Ele coloca voz numa ovelha grata, consciente e admirada, logo, adoradora.

O que ele sabe?

Que é ovelha. Sente-se ovelha a partir da visão que tem do Senhor como pastor. O verso primeiro acentua a consciência de ser ovelha, de forma que a interpretação linear da afirmação “O Senhor é o meu pastor”, funciona como alguém que já se sabia ovelha e agora estabelece ou confessa o Senhor como seu pastor.

É interessante que a palavra ovelha não aparece vez alguma no texto, mas os movimentos que se desdobram a partir da visão do pastor, deixam claro como o salmista se vê e se sente. De fato, é a fala de uma ovelha sob pastoreio. É uma fala conclusiva.

O Deus Eterno, no Velho Testamento, via Seu povo como ovelha, e Jesus declara que assim é que Ele vê os seres humanos. Isto indica que fomos criados para ter a natureza de ovelhas, cordeiros, mas na queda de Adão assumimos a natureza de lobos. É dito de Jesus que Ele era o Cordeiro que foi morto desde a fundação do mundo. Ele veio como cordeiro e veio recriar em nós essa essência perdida.

Quando ovelhas tentam se portar como lobos, elas vivem uma ilusão desastrosa e autopredatória. Assim somos nós. Se nos assumimos ovelhas, elegemos pastores que nos guiem e nos deixamos guiar por conta do instinto de dependência próprio de ovelhas. Se procuramos viver como lobos devoradores, elegemos lobos-alfa que ditam nossa existência predatória. E isto no mundo espiritual, no mundo político, no mundo das ideias e das relações parentais e sociais.

O salmista ao se conscientizar de ser ovelha em sua natureza essencial, correu para confessar e assumir o Senhor como Seu pastor. Antes, penso eu, que outro ocupasse esse lugar em sua vida.

O que ele experimenta?

 E então, em decorrência, ele vai desfiando os movimentos de sua existência sob esse pastoreio:

  • “de nada tenho falta”. Bem diferente de “nada me faltará”, onde a ênfase cai sobre coisas, enquanto a primeira ideia expressa ausência da necessidade da busca das coisas. Pois:
  • tem sede saciada;
  • descanso assegurado;
  • coração sem

São movimentos frutos da Presença. Ele está junto ao Pastor, que primeiro o mantém junto a Si, capacitando-o ao descanso, antes de levá-lo aos enfrentamentos.

Como ele vê o pastor no pastoreio que lhe oferece?

Seus olhos o vêem nos efeitos desse pastoreio, daí os verbos “guiar”; “estar junto”, “preparar o pão”, “ungir a cabeça”, e esta, na tradução rabínica tem o sentido de “honrar”. E o clímax da segurança aponta a certeza de que Ele será sempre misericordioso e bondoso como pastor, renovando Suas misericórdias a cada dia.

Depois, veremos como o pastor responde a esta consciência de  ovelha, na fala de Jesus em João 10, e então poderemos ver o paralelismo entre a adoração da ovelha e a oferta do Pastor a ela. É esse paralelismo que estabelece a estrutura espiritual de nossa fé, como seguidores de Cristo nesta geração. Há uma reciprocidade. A ovelha O reconhece, e o Pastor devolve, vendo- Se como pastor dela e outro tanto, ela, como Sua ovelha.

O que Ele sabe? 

  • Ele disse: “Eu Sou o bom pastor”. Está consciente de Seu compromisso com a bondade a favor da ovelha. Ele não pode ser diferente.
  • Jesus assume esse lugar, como ocupando o espaço aberto pela confissão do salmista, como sendo a resposta ao salmo. E revela em que consiste esta bondade: “Eu sou o bom pastor. O bom pastor dá a sua vida pelas ovelhas…assim como o Pai me conhece e eu conheço o Pai; e dou a minha vida pelas ovelhas.” – João 10:11, 15

O que se deduz daqui, é que todos aqueles movimentos do pastor no salmo 23, traduzem também a forma como Ele doa Sua vida. E o que mais se destaca é o fato de que o Senhor, como pastor, cumpre literalmente o que é próprio à vida de um pastor: ele vive no ambiente de suas ovelhas. Ele entra e fica lá com elas.

O que Ele experimenta? 

  • Entra pela porta no aprisco. Pode ser nosso coração? Sim. Basta lembrar Seu apelo à igreja de Laodicéia em Apocalipse 3:20. O abrir é uma confissão: “Quem me pastoreia é o Senhor Jesus”.
  • Ele conhece cada ovelha pelo seu nome.
  • Sabe ser conhecido por cada ovelha em Isto fala de ambiência. O pastor vivendo tão junto que tudo conhece, pois de tudo participa.
  • Cabe uma pergunta: “Se Jesus realiza Seu pastoreio em sua vida,

Ele  participa   e  pode   participar   de  todos   os  seus  movimentos existenciais?”

“…conheço as minhas ovelhas, e elas me conhecem, assim como o Pai me conhece e eu conheço o Pai;…” – João 10:14-15

“…e as ovelhas ouvem a sua voz. Ele chama as suas ovelhas pelo nome e as leva para fora.” – João 10:3. Intimismo. Nunca foi diferente. Sempre como Emanuel, companheiro.

Como Ele vê a ovelha para oferecer-lhe Seu pastoreio? 

  • Carente de ser guiada.

“Depois de conduzir para fora todas as suas ovelhas, vai adiante delas, e estas o seguem, porque conhecem a sua voz.”- João 10:4

A expressão “conduzir para fora”, fala da liberdade para viver, enfrentar a vida sob Seu cuidado.

Por que é importante e imprescindível vivermos pela fé a possibilidade desta simbiose que a graça de Deus nos oferece no pastoreio de Jesus?

Porque somos exatamente o que Jesus viu: “Vendo ele as multidões, compadeceu-se delas, porque estavam aflitas e exaustas como ovelhas que não têm pastor.” – Mateus 9:36

Temos a pretensão de ter respostas ou de achar que a carne, ou o mundo, têm as respostas que buscamos, mas eles não podem responder a necessidades eternas. Não nos dão segurança.

A metáfora criada por Jesus a nosso respeito é totalmente pertinente: Porque como ovelhas, não sabemos conduzir nossa vida sem riscos fatais pelos estreitos caminhos da justiça e perecemos. Comemos em mesas erradas, e bebemos em fontes que não saciam. Ele sabe conduzir.

Daí Sua gloriosa promessa: “…Eu cuidarei de ti”. – Oseias 14:8. Glória ao Seu Nome!