Nesta madrugada saí para o meu extenso quintal, atraído pela lua cheia (deve ser a idade do lobo), que estava no seu zênite sobre a minha cabeça, prateando todo o vale que se estende pelos fundos, ao longe. Era por demais atraente (“Não há, ó gente, ó não, luar como este do sertão), silenciosa no infinito, lembrando-me Jó: “se contemplei o sol em seu fulgor e a lua a mover-se esplêndida,” (Jó 31:26). Porque ela se movia, majestosa. Também me fez lembrar o poeta sacro, que por certo teria acondicionado a letra do seu poema, mudando sol para lua, quando pergunta: “Quem contempla o sol ardente quando visto em seu fulgor?; quem contemplará Aquele que do sol é criador?”. Ali fiquei eu, me sentindo na pele de Daví: “Quando contemplo os teus céus, obra dos teus dedos, a lua e as estrelas que ali firmaste, pergunto: Que é o homem, para que com ele te importes? E o filho do homem, para que com ele te preocupes?” (Salmos 8:3-4) e pensei comigo, pretensões à parte: “Diante do que está escrito quando da criação do Eden, Ele fez isso por mim”. Sim, em nível astronomicamente ínfimo, era para mim, também! Certamente foi o que Daví pensou e sentiu.
Ali fiquei, orando enquanto contemplava, e ainda a noite alta, comecei a ouvir o som nostálgico do gorjeio dos sabiás (“Minha terra tem palmeiras, onde canta o sabiá”) e pensei: “Não estão recolhidos? Antecipam o amanhecer?” O ruído foi crescendo.
Estou acostumado a ouvir o som pungente do canto do sabiá nos fins das tardes. Como disse, é um som nostálgico, que nos remonta à infância, hora do café da tarde, do retorno da escola, da chegada do pai que volta do trabalho… De pegar os derradeiros horários dos seriados da época: “A Feiticeira”, “Papai Sabe Tudo”; “Noviça Voadora”; “Viagem Submarina”; “Lassie”; e a memória navegou para longe, nostalgia pura! Tardes onde gritos de moleques na rua se misturavam ao som metódico de sabiás apaixonados. Eles cantam em setembro. Em outubro deitam seus ovinhos, e nova prole surge garantindo as melodias de novas primaveras. Mas nas madrugadas? Parecia novidade para mim.
E continuava a questão: “Não dormem? Não vêem que ainda demora o amanhecer? Seria efeito da linda lua?”
E então me dei conta de uma resposta tão simples: os sabiás voam, como todos os pássaros. E por isso sobem, vão ao alto, além das sombras da manhã vertida em noite. E surpreendem o sol antes de sua aurora nos baixios da terra. E entendí por que cantavam os sabiás ali. Era como se dissessem: “O sol já vem. Logo chega. Já vimos o seu brilho no horizonte distante”.
E então refleti com meu coração: “Não é assim com o crente? Ele pode cantar mesmo entre sombras, porque voa na fé a alturas onde primeiro vê que o Sol da Justiça, seu Cristo e Senhor, em breve resplandecerá sobre a terra, porque está vindo, já ao longe, no horizonte da Promessa”, pois “aqueles que esperam no Senhor renovam as suas forças. Voam alto como águias; correm e não ficam exaustos, andam e não se cansam” (Isaías 40:31).