Deserto Solitário e Solidário

Desde então começou Jesus a pregar, e a dizer: Arrependei-vos, porque é chegado o reino dos céus”. – Mateus 4:17.

Este versículo marca o momento inicial do ministério do Filho de Deus, logo após Ele se haver instalado em Cafarnaum, o que foi precedido por uma peregrinação de quarenta dias pelo deserto. Por sua vez, este deserto, palco de um tempo incomum de tribulação perpetrada pelo seu adversário, Satanás, tinha sido precedido por um espetáculo incomum de glória e exaltação, quando da confirmação de Sua filiação divina unigênita, através de uma voz que reverberou nas margens do Jordão desde o céu.

Entre o momento de glória e revestimento e o início do serviço, instalou-se um deserto de tentação sem igual.

Esse intervalo de quarenta dias de provação, repetia figuradamente outro intervalo ocorrido entre o chamado e a realização deste a um outro filho: Israel povo, que peregrinou pelo deserto quarenta dias transformados em anos correspondentes. O paralelo é interessante, pois que os dois desertos atenderam a movimentos e ocorrências assemelhados: testes de genuinidade de escolha e chamado divinos, em meio a fome e sede, caminhada errante e tudo induzido pelo próprio Deus que chamou. Manifestações tanto malígnas quanto angélicas. Ao povo foi dito: “É meu povo”, e a tentação pôs tal certeza em cheque. Ao Filho foi dito: “Tu és meu Filho”, e o tentador atacou exatamente esta certeza.

Os dois desertos foram precedidos de um chamado visível, convincente, marcado por sinais. Nos dois chamados havia o testemunho divino de legitimidade: a Israel, como povo de Deus, ungido. A Jesus, como o ungido Filho de Deus. As duas tentações puseram em cheque essas certezas e garantias. O término de cada uma redundou em início de uma etapa definitiva que cumpria a razão do chamado recebido.

Mas o interregno era solidão.

Houve presença de glória no momento inaugural. Mas deserto e solidão no campo de preparação para o serviço.

Israel e Jesus parecem sinalar para nós um padrão de ação divina quanto àqueles que Ele chama. Seja para integrar Seu povo, seja para realização de um ministério solo, específico.

Há a marca indelével da eleição, às vezes verdadeira teofania, mas a ela sucede uma peregrinação de silêncio, provas e testes, onde a solidão parece só não ser mais devido a “estranhas presenças” e consequentes ocorrências. Contudo a nota de destaque é a solidão. Esta terá de ser uma constante na vida dos que caminham com Deus. Às vezes achados a sós em meio a tantos.

Surgem anjos ajudadores, para animar e alimentar, vertidos em amigos e irmãos, quando s testes são vencidos. Sempre.

Por fim, tudo pronto? Não! É hora de começar aquilo para que se foi chamado. E tal começo, terá sempre característica de começo. Sempre haverá a sensação de que tudo é um início, de que sempre somos iniciantes na Grande Jornada.

Penso que chamados desprovidos dessas características deixarão sobre incertezas sobre sua fonte. Nosso Deus não muda.