“Isaque formou lavoura naquela terra e no mesmo ano colheu a cem por um, porque o Senhor o abençoou. O homem enriqueceu, e a sua riqueza continuou a aumentar, até que ficou riquíssimo. Possuía tantos rebanhos e servos que os filisteus o invejavam. Estes taparam todos os poços que os servos de Abraão, pai de Isaque, tinham cavado na sua época, enchendo-os de terra. Então Abimeleque pediu a Isaque: “Sai de nossa terra, pois já és poderoso demais para nós”. Por isso Isaque mudou-se de lá, acampou no vale de Gerar e ali se estabeleceu. Isaque reabriu os poços cavados no tempo de seu pai, Abraão, os quais os filisteus fecharam depois que Abraão morreu, e deu-lhes os mesmos nomes que seu pai lhes tinha dado.” – Gênesis 26: 12-18.
Nosso propósito é tomar este texto histórico e fazer uma analogia sobre ele, da nossa caminhada cristã, como numa metáfora.
O que temos nele? A história da peregrinação de Isaque, filho de Abraão, pelo território dos filisteus em Gerar, nos dias de Abimeleque. O texto nos conta que Abraão havia, anos antes, cavado poços naquela região árida, imprescindíveis para a continuidade da vida e possibilidade de prosperar ali. Mas os filisteus, depois da morte de Abraão, entupiram, entulharam os poços e os fecharam. Isaque desentulhou aqueles poços e eles voltaram a fluir.
Onde a analogia?
Permitam-me mostrar-lhes que nossa vida espiritual foi estabelecida para sermos fontes de águas do Espírito de Deus, ou seja, fontes de onde fluem as águas do Espírito Santo, águas da vida. Lemos isto em João 7: 38 e 39. Isto concorda com Apocalipse 22:17, onde a Igreja, vista como a noiva, convida o povo a vir beber água da vida. Ela a tem para dar.
Mas quero salientar a imagem dinâmica de fonte, criada por Jesus, quando fala do Espírito no interior do crente. Ela é intensa: fala de rios que fluem. Está no plural. Uma fonte com diversos veios a correr. Sobre esse rio, Ezequiel cria uma metáfora dizendo que por onde ele passa, vida é produzida. Pessoas se saciam, se alimentam. A imagem é de vida, refrigério, porque água atende a esses construtos de forma plena.
Mas há também aí embutida a idéia de dinamismo, intensidade. Algo que não pode ser contido. Que força para sair. Como um poço, a água sai de dentro para
fora. E não pode ser contida. Transforma-se num rio, ou seja, a idéia não é de reservatório, mas algo que flua, que se externaliza.
Temos o substrato perfeito disso na vida dos apóstolos, como descrito em Atos. Mas também na história da Igreja moderna, como pontilhada por homens e mulheres tais como Finney, Moody, William Booth e sua filha Catarina. Temos Billy Graham, Corrie Ten Boom, e tantos outros que nos rodearam a vida, caracterizados por enchimentos e transbordamentos do Espírito de Deus, numa vida abundante, frutífera, dinâmica por sua paixão por Cristo, fluindo refrigério e vida e dessedentando tantos quantos deles se aproximaram. Não falo de ativismo. Ativismo não vem do Espírito, é de fora para dentro e esgota. Falo de paixão, primeiro amor, sonhos eternos que se materializam em vidas humanas.
Mas, uma realidade funesta cerca as vidas-fontes: a possibilidade de serem interditadas, terem o fluir impedido, como poços entulhados.
Nos dias de Isaque foram os filisteus que o fizeram. E os poços deixaram de fluir. Mas na vida do crente, isso pode acontecer? Sabemos que sim. E as causas são várias: pecado, entulhos de coisas jogadas para dentro, que sujam, entopem. Às vezes mágoas, tristezas, aborrecimentos, decepções. A Bíblia adverte sobre tal possibilidade: Efésios 4:30; I Tessalonicenses 5:19.
A própria igreja de Éfeso foi exemplo disso, como falou o Senhor em Apocalipse 2:4 e hoje vemos esse sinistro se repetir diante de nossos olhos, quando nos deparamos com uma igreja de nossos dias, tão fornida de atividades, festas, cores e sons. Nossos cultos são até divertidos, mas não vias de transformação, introspecção e quebrantamento. A igreja vazia de paixão. Longe do fluir genuíno e refrigerador do Espírito que a coloca admirada e adoradora a Seus pés. Às vezes cheia de emoção , mas vazia de paixão. A emoção dura um culto. A paixão marca a existência toda.
A Realidade que nos Cerca
A geração que nos cerca hoje desconhece a linguagem de uma vida apaixonada pelo Senhor e Seu Reino, onde Ele é a causa e a primazia de todos os propósitos. É como poços entulhados que não deixam a água fluir viva e abundante.
Seria essa a sua situação espiritual hoje? Seco. Mecanizado na fé; desmotivado; sem paixão? Até mesmo vazio? Um poço com uma fome voraz de entulhos das coisas desta vida? Onde sua paixão? Onde o primeiro amor que ocupa o único lugar que a Ele pertence em sua vida? Às vezes até parentes e amigos ocupam esse lugar. Têm a primazia, e funcionam aos olhos de Deus como verdadeiros entulhos para impedirem o fluir livre do Espírito.
O que fez Isaque com os poços entulhados? Ele os reabriu, desentulhou. Pensemos nesses movimentos de Isaque: Antes de pretender cavar poços novos, ele assumiu que deveria desentulhar os antigos, abertos por seu pai. Isto fala de voltar às origens, restabelecer marcos perdidos.
E como se faz esta tarefa?
Antes de tudo é imprescindível se dar conta de que os poços estão entulhados. Nada de negação, antes, reconhecer os entulhos como tais. E então decidir lançar mão deles, um a um, e jogá-los fora, longe do poço: comprometimentos indevidos, maus hábitos, coisas que embaraçam, incompatíveis com o caráter e o espírito do Reino de Deus, vistas em atitudes, expressões, decisões, compromissos.
A ferramenta principal é confissão. E arrependimento é a corda que nos faz ir descendo ao poço, à medida em que escavamos os entulhos, assumindo atitudes, e nessa tarefa, vamos sumindo, nos apequenando, desaparecendo, até chegarmos de novo ao veio de água, que livre, volta a fluir. A princípio, tímidamente, mas crescendo pouco a pouco, até virar um ribeiro que não se pode passar a pé, e aqui nos remontamos de novo à visão profética de Ezequiel, que é o nível profundo onde Deus pretende nos levar.