Sempre amei a trilogia de Lucas 15, onde coisas são perdidas ou se perdem e são achadas. Gosto de ver o resultado que isso produz, como tristeza pela perda, a busca e a alegria pelo reencontro. Encanta-me. Tenho pregado em diversas oportunidades sobre este tema, tanto em reuniões simples quanto em congressos para muita gente. A cada vez a abordagem do texto me surpreende, preenche, renova e deixa um quê de mistério pelo inesgotável da riqueza da Palavra de Deus.
Volto ao texto, pensando na segunda fala da trilogia: a parábola da moeda perdida.
“Ou, qual é a mulher que, possuindo dez dracmas e, perdendo uma delas, não acende uma candeia, varre a casa e procura atentamente, até encontrá-la? E quando a encontra, reúne suas amigas e vizinhas e diz: ‘Alegrem-se comigo, pois encontrei minha moeda perdida’. Eu digo que, da mesma forma, há alegria na presença dos anjos de Deus por um pecador que se arrepende”. Lucas 15:8-10.
Insisto em ver na mensagem pretendida por Jesus a indicação de que um valor se perde numa casa, dentro de casa. A moeda é um valor, e quem a perde é quem dela teria de cuidar. Ocorrem- me coisas várias das quais uma eu desejo compartilhar: valores podem ser construídos ou perdidos a partir da casa. Um valor construído em casa, não se perderá nunca “lá fora”, quando tiver de estar “lá fora”. Mas também é fato que um valor perdido dentro de casa, jamais será achado lá fora, como valor. Ainda que se lhe atribuam valores, estes não produzirão o mesmo efeito.
Lembro de haver atendido por meses uma mulher cuja auto-estima estava aniquilada. Por conta disso ela aceitava qualquer oferta de valores que outros lhe atribuíssem, e vivia infeliz. Não conseguia crer em si mesma. À medida em que avançavam nossos discursos foi ficando evidente que sua auto-estima havia sido deformada na infância, por sua própria mãe que enaltecia sua irmã mais velha com quem a media “por baixo”. Ela cresceu crendo nesse desvalor. Nosso trabalho, muito custoso, foi desconstruir aquela visão de menos valia que sua mãe, a dona do valor da casa, lhe atribuíra. Coincidência de personagens apenas, mas o fato é que a dona da moeda algumas vezes é um marido, um pai, um irmão mais velho.
A segunda fala da trilogia mostra essa possibilidade. Mas mostra também que o valor perdido pode ter sua falta percebida em tempo, e por conta disso, restaurar-se ou ser restaurado. E a fala do texto indica os meios dessa restauração: enceta-se uma busca; desarruma-se o que está ocupando o lugar do valor perdido; vasculha-se tudo para ver atrás de quais substitutos ou esconderijos esse valor se alojou ou se escondeu ou foi escondido. Na luta por restaurar o valor, afasta-se do lugar o que pode estar impedindo, escondendo. E serve-se de uma lâmpada, uma luz para favorecer a busca. E a luz tem seu lugar, porque dissipa sombras, realça detalhes, faz brilhar ou evidencia brilhos antes não percebidos.
Então penso na luz. De que luz nos servimos para reencontrar valores em outros ao nosso derredor? Lembrando do que disse Jesus: “Vocês são a luz do mundo”, só me resta entender que a luz é minha própria vida, um derramar de mim sobre outras vidas, para que possa identificar-me nelas, identificá-las comigo. Como tenho animais domésticos, aprendi com eles que, quando querem identificar-se com algo ou alguém, eles procuram transferir seu cheiro, chegando junto, esfregando-se, de tal forma que o “outro” adquire um aroma que eles reconhecem como parte de si. Porque achar valores perdidos não vai muito além de transferir a outros aqueles que identificamos em nós mesmos.